"IPSUM
AUDITE"
S. Mateus XVII, 1-9
Caríssimos e amados irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo!
No Evangelho do domingo último passado vimos o Filho de Deus
no deserto, entre os animais selvagens, em luta com o espírito das trevas.
Hoje, o Evangelho já nos mostra Jesus num Monte muito alto, com os três
apóstolos prediletos, Pedro, que seria o primeiro Chefe visível da Igreja,
João, o discípulo que Jesus mais amava, Tiago, que seria o primeiro apóstolo a
morrer mártir. Hoje, vemos Jesus entre Moisés e Elias. Hoje o Pai, do alto dos
céus proclama: "Este é meu Filho bem amado no qual pus toda minha
complacência, ouvi-O".
Caríssimos, estes dois evangelhos representam a imagem dos
dois estados aos quais somos chamados, e que devem ocupar nossa existência: um
estado de sofrimento, de luta, de trabalho aqui em baixo; um estado de alegria,
de repouso, de glória lá em cima. Aqui os jejuns, as penitências, os combates
contra a luxúria, o orgulho e a avareza; combate renhido e diuturno contra o
demônio, príncipe deste mundo que está nele colocado. Aqui em baixo os desejos
que não podem ser nunca satisfeitos, um deserto árido, os animais selvagens,
isto é, os vícios, os crimes, as monstruosidades no meio dos quais somos
obrigados a viver e que nos causam medo e repugnância. Lá no alto, muito ao
contrário, teremos as delícias inalteráveis, a satisfação perfeita de toda
nossa ânsia de felicidade, uma sociedade santa onde gozar-se-á um doce
entretenimento com os profetas, com Jesus e com Deus. Ah! caríssimos, que os
gozos deste segundo estado nos deem forças para passarmos intrépidos e ilesos
pelo primeiro!
Aquele primeiro estado, tomado num círculo mais restrito, é
a santa quaresma: são os jejuns, as abstinências, as orações, os santos ofícios
aos quais a Santa Igreja nos convida durante este tempo, as lutas às quais nos
exorta contra nós mesmos, contra nossas más inclinações, contra o amor dos
prazeres, contra nossos hábitos viciosos, contra o orgulho da vida, contra a
sede das riquezas. Com a graça de Deus, suportamos valorosamente esta luta,
jejuamos, rezamos, escutamos a palavra de Deus, fazemos violência à nossa carne
corrompida, reprimimos nossas concupiscências, domamos nosso coração. E assim
fazendo, como Deus não se deixa vencer em generosidade, recompensa nossa
correspondência à Sua graça e, depois deste curtos esforços, nos dá as alegria
da Ressurreição, as festas pascais, durante as quais nós veremos Jesus
transfigurado, Jesus na glória, e nós mesmos, purificados pelo combate, pela penitência,
lágrimas e pelo sacramento da Confissão,
nos ajoelharemos à mesa da comunhão e seremos alimentados pelo próprio Jesus e
nos entreteremos familiarmente com Deus.
Caríssimos, retomando nossa ideia primeira, devemos observar
que, para chegarmos ao estado de felicidade perfeita na Pátria do repouso eterno, mister se faz
passar pelo primeiro estado de sofrimentos e tentações aqui na terra. Se Jesus,
porque tomou sobre Si os nossos pecados, disse que foi necessário sofrer antes
de entrar na Glória, como vamos pretender chegarmos ao Céu, sem passar pelos
sofrimentos, sem lutarmos, nós que somos os pecadores? Não podemos, como S.
Pedro, querer permanecer para sempre no Monte Tabor, sem antes passarmos pelo
Monte Calvário. Se para se chegar à glória mesmo aqui em baixo, chegar à posse dos bens terrestres, estes
bens perecíveis, estes bens de um dia, é preciso trabalhar, lutar e sofrer; com
infinita mais razão é preciso sofrer, lutar e trabalhar para se chegar à Glória
celestial. Devemos observar que outro evangelista (S. Lucas IX, 31 ) diz que
Jesus na Transfiguração falava com Moisés e Elias sobre Sua próxima "saída deste mundo que ia se realizar
em Jerusalém, o que significa que o Divino Mestre comentava sobre Sua
Paixão e Morte. Assim não podemos separar estes dois montes, o do Tabor e o do
Calvário. Devemos estar profundamente convencidos do que disse o próprio Jesus:
" O Reino dos Céus sofre violência
e só os violentos o poderão arrebatar". O caminho do Céu é o caminho da
cruz!
"Enquanto Pedro ainda falava com Jesus, "uma nuvem brilhante os envolveu, e da
nuvem soou uma voz que dizia: 'Este é o meu Filho muito amado, em quem pus toda
a minha complacência; ouviu-O". Esta nuvem luminosa que envolve ao
mesmo tempo a Jesus, Moisés, Elias e os apóstolos, é a Fé. Ela, pois, expande
sua doce luz nos nossos espíritos, uma luz que não é isenta de toda sombra. Ela
é luz, mas é também sempre nuvem. Por esta luz vemos Deus, Jesus Cristo, os
profetas, os apóstolos, mas não totalmente descobertos. Na verdade, só no Céu
não haverá mais nuvem; pois, veremos a Deus face a face e sem véu. Agora, pela
fé O vemos como em enigma ou como num espelho embaçado. Mas, mesmo assim a Fé é
suficiente para alumiar o nosso caminho e nos guiar até às eternas moradas de
luz indefectível.
Por isso, disse o Pai
Eterno: "este é o meu Filho muito
amado, em quem pus toda a minha complacência; ouviu-O". Deus não
poderia dar Seu Filho aos homens como Mestre de uma maneira mais brilhante e
solene! É em presença de Moisés que representava a Lei, é em presença de Elias,
que representava as Profecias, é em presença dos apóstolos, isto é, em presença
do Antigo e do Novo Testamento: "ESTE
É MEU FILHO BEM-AMADO, OUVIU-O". Deus até então havia falado aos homens
por meio de Moisés, dos Patriarcas e dos
Profetas, mas agora no Novo Testamento fala pelo Seu próprio Filho. É o Filho
de Deus feito Homem que devemos agora ouvir como o Mestre por excelência: "Ipsum audite" (= ouvi-O). É
portanto uma coisa solidamente estabelecida, uma coisa certíssima: Jesus Cristo
é o nosso Mestre! "Eu estarei convosco até a consumação dos séculos".
Jesus nos falou, fala e falará até o fim do mundo através de sua verdadeira
Igreja, que nunca poderá deixar de pregar o mesmo que pregou o Divino Mestre: "Jesus é o caminho, a verdade, a
vida". E Ele, que é a própria verdade, não muda; Ele é sempre o mesmo,
ontem, hoje e sempre". Eis porque S. Paulo na mais rigorosa lógica,
conclui: " Portanto rejeitai toda
doutrina nova e estranha". E Jesus Cristo, Filho deleto do Pai, não
somente nos fala, mas dá-nos a força de O seguir: ensina-nos a Verdade e nos
ajuda a crer; nos ordena a prática do bem e nos dá a graça para o realizar.
Caríssimos, que outro mestre poderíamos seguir se Nosso Senhor Jesus Cristo é o
Filho bem-amado de Deus? Estes outros "mestres" são homens fracos,
ignorantes, malgrado o alarde orgulhoso de sua ciência. Estes não podem ser nem
o caminho, nem a verdade e nem a vida. Só devem ser ouvidos aqueles pregadores
que foram chamados por Jesus e pregam com toda fidelidade o que Ele ensinou. Estes
verdadeiros ministros de Jesus Cristo dão testemunho da Verdade que é o próprio
Divino Mestre. Eles procuram destruir os preconceitos, os erros e as diatribes
deles decorrentes.
É absolutamente necessário que ouçamos o Divino Mestre
através dos Santos Evangelhos pregados com toda fidelidade pelos Seus
verdadeiros discípulos. Estes, sim, no meio desta geração adúltera e pecadora,
não se envergonham da doutrina do Evangelho de Jesus, mas dele dão testemunho intrépido e constante.
Assistimos com grandíssima tristeza a apostasia de muitos e
muitos; e uma das causas desta derrocada na fé, é porque os homens na sua
maioria procuram novidades que agradam e afastam os ouvidos da verdade para os
aplicarem às fábulas que o mundo com seus possantes meios de divulgação,
apresenta às estas pobres almas.
Por isso, caríssimos e amados irmãos, procuremos estar bem
presos ao Nosso Divino Mestre, porque só Ele tem palavras de vida eterna.
Somente Suas palavras permanecem para sempre: "IPSUM AUDITE!" Amém!
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