SAUDAÇÕES E BOAS VINDAS

LOUVADO SEJA NOSSO SENHOR JESUS CRISTO! PARA SEMPRE SEJA LOUVADO!

Caríssimos e amados irmãos e irmãs em Nosso Senhor Jesus Cristo! Sêde BEM-VINDOS!!! Através do CATECISMO, das HOMILIAS DOMINICAIS e dos SERMÕES, este blog, com a graça de Deus, tem por objetivo transmitir a DOUTRINA de Nosso Senhor Jesus Cristo. Só Ele tem palavras de vida eterna. Jesus, o Bom Pastor, veio para que Suas ovelhas tenham a vida, e com abundância. Ele é a LUZ: quem O segue não anda nas trevas.

Que Jesus Cristo seja realmente para todos vós: O CAMINHO, A VERDADE, A VIDA, A PAZ E A LUZ! Amém!

domingo, 13 de dezembro de 2015

HOMILIA DOMINICAL - 3º DOMINGO DO ADVENTO

Fora postado em 2011

   Leituras: Epístola de São Paulo aos Filipenses, IV, 4-7; Evangelho segundo São João, I, 19-28.

    Caríssimos e amados fiéis, em Nosso Senhor Jesus Cristo!
  
   "Alegrai-vos: o Senhor está perto!"

Jesus e São João Batista (Murillo)
   Toda a liturgia deste domingo nos convida a gozar a proximidade do Redentor: A Santa Missa de hoje inicia-se com estas palavras: "Alegrai-vos incessantemente no Senhor, outra vez vos digo, alegrai-vos... o Senhor está perto!" O mesmo repete a Epístola. O motivo da alegria é só este: "O Senhor está perto!" E São Paulo nos exorta a não termos outros desejos: "o Senhor está perto, não vos inquieteis com nada... A paz de Deus, que está acima de todo entendimento, guarde os vossos corações". Uma só coisa é necessária: buscar a Deus e em Deus acharemos tudo o que é preciso. Por isso, a proximidade de Nosso Senhor é para nós fonte, não só de viva alegria, mas também de paz. Pois n'Ele temos tudo. Deus nos basta. E São João Batista diz no Evangelho: "O Senhor está no meio de vós e vós não o conheceis". O Batista dirigia estas palavras aos judeus. Mas nós temos também Jesus no meio de nós, nos Tabernáculos pela Eucaristia, temo-Lo dentro de nós pela graça. Mas quem O conhece? Somente aquele que tem fé. Reaviva, pois, a tua fé, porque na medida em que acreditares, acharás e conhecerás a Jesus. 
   Caríssimos e amados fiéis, eis que nos encontramos de novo com aquele filho de Zacarias, cujo nascimento fizera estremecer de gozo as montanhas da Judéia. Uma vida de silêncio, na solidão, naquela solidão de rochas nuas e abruptos barrancos, que se estende por entre os montes do Hebron e a margem ocidental do Mar Morto. Errante à maneira dos antigos profetas, hoje numa gruta, amanhã numa choça, naquele deserto onde apenas alguns arbustos espinhosos podiam resistir aos ardores de uma terra situada a trezentos metros abaixo do nível do mar. João entregava-se às mais duras penitências. Consagrado a Jehová desde o nascimento, era um nazareu. Nunca cortara o cabelo, nunca provara vinho, nem tocara mulher, nem conhecera outro amor além do amor de Deus. Vestia uma pele de camelo, trazia um cinto de couro, bebia água das torrentes e comia mel silvestre e gafanhotos. Não podia esquecer as palavras que o anjo dissera a seu pai diante do véu sagrado: "Caminhará na presença de Deus, com o espírito e a virtude de Elias, para pôr os corações dos pais nos filhos, para infundir nos incrédulos a prudência dos justos, para preparar para o Senhor um povo perfeito".
   O profeta Malaquias fala-lhe do conselheiro que o Senhor enviará para abrir os caminhos do Messias. O profeta Isaías leva até os seus ouvidos os ecos da voz que clama no deserto: "Preparai os caminhos do Senhor; endireitai as suas veredas; todo o vale será levantado e todo o monte aplainado e toda a carne verá a salvação de Deus". Esta voz é a tua, diz o Espírito Santo do fundo do ser; tu és o mensageiro; o reino de Deus aproxima-se, é preciso domar o orgulho dos soberbos; é necessário pregar a penitência, a purificação, o cumprimento da Lei. E, com uma certeza divina, João compreende que é ele o precursor da grande obra preparada durante vários séculos e gerações. Grave, austero, transfigurado pela penitência, queimadas as carnes pelo sol do deserto, abrasada a alma pelo desejo do reino, pupilas relampejantes, longa cabeleira ondulando-lhe pelas costas, barba espessa cobrindo-lhe o rosto, e a boca proferindo palavras penetrantes e inflamadas. Traz ao mesmo tempo esperanças e anátemas, consolações e terrores. O seu gesto domina, a sua presença impõe-se, a sua austeridade espanta, e uma força magnética se lhe desprende dos olhos. Fulmina, exorta, batiza. O seu aparecimento enche toda a Palestina. "Que havemos de fazer, homem de Deus?" - perguntavam-lhe chorosos e aturdidos por aquela palavra de fogo, que caía sobre a multidão como um relâmpago, como se fosse pronunciada pelos lábios de Elias. E ele respondia-lhes, severo: "Fazei penitência, porque se aproxima o reino de Deus". Impressionados por tais palavras, muitos dos ouvintes renunciavam à vida passada e prorrompiam em gritos de dor e arrependimento Então João submetia-os a dois ritos, ambos de clara significação: o batismo e a confissão dos pecados. A primeira coisa que João exigia dos ouvintes era o arrependimento, isto é, uma transformação completa da maneira de pensar e de viver.
  "Vinham até João, diz São Mateus, toda a Jerusalém, toda a Judéia e toda a terra da comarca do Jordão". Severo para com os hipócritas e soberbos, João só se mostrava indulgente para com os corações retos e dóceis: "Que todo aquele que tiver duas túnicas dê uma ao que anda nu, e quem tiver um bocado de pão que o reparta com quem tem fome". Aos publicanos, execrados pelos fariseus, contentava-se com fazer esta recomendação: "Não exijais mais do que vos é lícito exigir". Aos soldados do tetrarca Herodes, inclinados à violência, não os obrigava a deixar a profissão; limitava-se a dar-lhes este conselho: "Não roubeis, não ultrajeis o povo; contentai-vos com o vosso soldo".
   Os fariseus e doutores também iam lá: bisbilhotar, espiar e troçar da missão do Batista, precursor de Jesus, seu amigo, seu parente. O pregador tinha o seu mais terrível anátema reservado para estes orgulhosos. Fazia o mesmo que o Divino Mestre. "Raça de víboras, dizia-lhes João, quem vos ensinou a fugir à cólera que está prestes a cair sobre vós? Produzi frutos dignos de penitência, porque o machado já toca a raiz da árvore. Toda árvore que não der fruto será cortada e lançada ao fogo". O profeta adivinhava o pensamento mais íntimo daqueles homens orgulhosos da sua origem, e encontrava uma imagem impressionante para condenar a estabilidade ilusória que se cobre com privilégios de raça. "Não digais para convosco: Abraão é nosso pai, porque vos garanto que até destas pedras Deus pode extrair filhos de Abraão".
   João Batista cumpre com fidelidade a sua missão: procura atrair as atenções para o cumprimento da importante profecia de Isaías que anuncia a vinda do Redentor. "Eu sou a voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor". Que humildade e zelo de São João! Com que amor proclama a vinda e excelência d'Aquele que anuncia! Com que sinceridade se considera puro nada diante d'Ele, como indigno de exercer a seu respeito o ofício do último dos seus servos. É que São João era um homem de fé. Tinha certeza que Jesus era Deus. "Ele existiu antes de mim!"
   Jesus está nos sacrários, está entre nós! Mas  é o grande desconhecido e abandonado! Para terminar, eis um exemplo bíblico: Privado por Davi seu pai da honra de comparecer à sua presença, Absalão não sabe achar paz. De que lhe valeu ter fugido à morte, se, vivo, é-lhe proibido ver o rosto de seu pai? Triste de dia, inquieto de noite, ele gira como uma sombra soluçante em torno do palácio real, penetra furtivamente nas antecâmeras e suplica a alguém que lhe obtenha o suspirado favor. Um dia, não podendo mais, detém Joab e lhe diz:"Vai à presença do rei meu pai, e dize-lhe que há dois anos eu definho. Que ele não me negue mais ver a sua face! E se meu crime é tal que me não deixe esperar perdão, ó Joab, dize-lhe que mais doce me é morrer do que viver sem vê-lo".
  Ó cristãos, que frisante confronto entre nós e esse filho desnaturado e infeliz! No Santo Tabernáculo onde se fez eterno prisioneiro de amor, Jesus não nos proíbe ir a Ele, antes nos convida: "Vós que trabalhais, vós que estais aflitos, sobrecarregados de problemas, vinde a mim, e eu vos aliviarei!" E, contudo, por todo o dia as igrejas estão sempre silenciosas e desertas como um túmulo. Quantas vezes se passa diante da igreja; e por que não se entra ao menos um minuto para saudar Jesus? A resposta é óbvia: são pouquíssimos os precursores de Jesus como foi São João Batista. É triste dizê-lo: muitos que são, ou melhor, deveriam ser precursores de Jesus, não têm fé. Pior: trabalham para arrancá-la dos poucos que ainda  crêem.
  Ó Jesus! Concedei-nos a graça de Vos amar, de Vos servir e de Vos fazer conhecido de todos os povos, com o mesmo amor, a mesma humildade e o mesmo zelo que teve o vosso Precursor! Amém!
  

domingo, 6 de dezembro de 2015

HOMILIA DOMINICAL - 2º DOMINGO DO ADVENTO

   Queridos e amados leitores em Nosso Senhor Jesus Cristo!

   Leituras desta Santa Missa: Epístola (Rom. XV, 4-13); Evangelho (S.Mat. XI, 2-10).

   A Santa Missa de hoje inicia-se com estas palavras: "Povo de Sião, eis que o Senhor vem para salvar as nações". 
   Tenhamos toda confiança em Nosso Senhor Jesus Cristo. Alegremo-nos conforme os desejos de São Paulo: "O Deus da esperança vos encha de todo o gozo e de paz na vossa fé, para que abundeis na esperança" (Rom. XV, 4 e 13). E para que a nossa esperança em Jesus Cristo seja estimulada também por fatos concretos, o Evangelho descreve-nos a grandeza das Suas obras: os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos são limpos, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam, os pobres são evangelizados"
   No Evangelho de hoje Jesus Cristo apresenta-nos a figura forte e austera de São João Batista: "Que fostes  ver no deserto? Uma cana agitada pelo vento?... Um homem mole, de luxo, vestido com roupas delicadas? Não!" Mas que fostes ver? Um profeta? Sim! e mais que um profeta. Porque, este é aquele do qual foi escrito: Eis que envio diante de tua face o meu Mensageiro, que preparará o teu caminho adiante de ti".
   Caríssimos e amados irmãos, se queremos preparar os nossos corações para a vinda do Senhor, devemos calcar aos pés os bens terrenos, desapegando inteiramente o nosso coração de nós mesmos e das coisas materiais. Se queremos saborear as doces alegrias do Natal, devemos saber preparar-nos para elas com aquelas disposições que a Igreja hoje nos convida a pedir: "Nós Vos suplicamos, Senhor, que... nos ensineis a desprezar as coisas da terra e a amar as do céu".
   Que alegria para São João Batista ser elogiado pelo próprio Jesus! Mas, também, caríssimos e amados irmãos que alegria para nós sermos instruídos por Jesus com estes mesmos elogios feitos ao Seu Precursor. Sabemos, assim o que Jesus quer que façamos para merecermos também os mesmos elogios. Assim  vamos, com a graça de Deus, procurar guardar e praticar, de acordo com os nossos deveres de estado, as palavras de Jesus elogiando o Seu Precursor.  Mas antes creio ser necessário dissipar uma possível dúvida: João Batista manda dois discípulos perguntar a Jesus se Ele era o Messias ou se deveriam esperar outro. São João estava preso em Maqueronte, nas margens do mar Morto. Sabia que uns dias mais e deixaria de existir. Tinha nascido para ser o Precursor do Messias, aí estava a razão de sua vida. Sentia a cabeça ameaçada e eis que a sua missão não fora ainda coroada com a manifestação solene de Jesus Cristo. João Batista percebia que muitos de seus discípulos ainda estavam presos a ele e não queriam seguir a Cristo. Certamente isto o preocupava. Ele havia dito: "É preciso que Cristo cresça e que eu diminua". "Não sou digno nem sequer de desatar as correias de suas sandálias". Certamente os que iam visitá-lo ali na prisão, falavam-lhe do Taumaturgo, descreviam-lhe os seus milagres, repetiam-lhe suas palavras. São João Batista havia mostrado Jesus às multidões reunidas às margens do Jordão: "Eis o Cordeiro de Deus, eis Aquele que tira os pecados do mundo". Portanto, ele bem sabia que Jesus era o Cristo, o Messias prometido e tão desejado; mas prevendo a sua morte próxima, queria o precursor que os seus discípulos se certificassem, por si mesmos, da divindade de Jesus. Os dois discípulos de João aproximaram-se de Jesus e disseram-lhe: "João envia-nos para te perguntar se és o que há de vir ou se devemos esperar outro". A resposta de Jesus tem uma transcendência enorme para nós. A princípio não diz uma nem duas. Continua a percorrer as fileiras daqueles infelizes doentes; os seus lábios sorriem aos rostos abrasados pela febre; as suas mãos passam sobre as chagas purulentas; os seus olhos inundam de luz os corações ensombrados pela tristeza, o seu hálito cai sobre as feridas como bálsamo de virtude maravilhosa. E os cegos vêem, ouvem os surdos e saltam pelo campo os paralíticos, e todos gritam de alegria incontida pela saúde recobrada.
   "Agora, disse Jesus aos enviados, ide e contai a João o que vistes e ouvistes; os cegos vêem, os surdos ouvem, os coxos andam, os mortos ressuscitam e os pobres são evangelizados". Jesus recorre aos mesmos termos que Isaías tinha empregado para descrever os efeitos da aparição do Messias. Este argumento era suficiente para convencer espíritos de boa vontade. Jesus sendo Deus, via outrossim, os espíritos orgulhosos que não se dobrariam diante da evidência dos milagres e da realização dos profecias. Por isso acrescentou: "Bem-aventurado o que não se escandalizar de mim".
   Logo que os emissários desapareceram - assim, ninguém poderia ver a menor sombra de adulação nas suas palavras - Jesus fez do preso de Maqueronte o panegírico mais fervoroso que jamais se fez de algum homem: "Que fostes ver no deserto? Uma cana agitada pelos ventos? Não. Que fostes ver? Um homem delicadamente vestido? Não. Os que usam vestidos finos habitam os palácios dos reis". Não era, decerto, uma cana frágil aquele homem coberto de peles, que se alimentava de gafanhotos e se apresentava ao tirano para lhe lançar em rosto o seu adultério e incesto. O que tinha levado o povo ao deserto fora a presença de um profeta, nem mais nem menos que o Precursor acerca do qual Malaquias dissera: "Eis que vos envio o meu mensageiro para preparar os caminhos diante de Mim". "Na verdade vos digo: entre os nascidos de mulher, disse Jesus,  não há nenhum maior que João Batista".
   Caríssimos e amados irmãos, não nos contentemos em admirar São João Batista. Imitemos sua vida recolhida. Deus não está na agitação e no barulho. O próprio Deus diz: "Conduzirei a alma à solidão e ali lhe falarei ao coração" (Oséas, II, 14). Imitemos o recolhimento de São João Batista sobretudo neste tempo do santo Advento. Imitemo-lhe igualmente a firmeza e constância no bem, seu espírito de penitência e de mortificação. Enfim, sua pureza angélica e seu zelo em glorificar a Nosso Senhor Jesus Cristo, em fazê-Lo conhecido e amado por todos.
   Possamos, nós também, caríssimos e amados irmãos, merecer os elogios de Jesus e sermos um dia participantes de Sua glória no céu!
   Quero terminar, contando um exemplo de fortaleza, de firmeza na fé: Uma menina americana de nome Graça Minford, convertida do protestantismo e tornada freira dominicana. Seu pai, morrendo, deixou-lhe a fabulosa soma de 12 milhões e meio de dólares, com a condição de ela abandonar o convento e a Igreja Católica. E que foi que essa menina respondeu? "Meu Pai do céu é bastante mais rico do que meu pai da terra, e dar-me-á uma recompensa ainda maior". A jovem Minford não era decerto uma cana agitada pelo vento. Sua atitude denota toda a convicção e força de uma alma verdadeiramente cristã.
   Caríssimos e amados irmãos, hoje, mais do que nunca, precisamos dar testemunho de Nosso Senhor Jesus Cristo, no meio desta geração adúltera e pecadora. Peçamos a Jesus esta graça. Ó Senhor, ensinai-nos a desprezar as coisas da terra e a amar as do céu! Amém!

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Cabe só aos sacerdotes dar a comunhão

   Esta tese é provada por Santo Tomás de Aquino (IV Sent. dist. XIII, q. 1 a 3, qa 1, 2; S. T. q. LXXXII, a. III.  Vê-lo-emos no próximo post, se Deus quiser. 

   Agora quero apenas fazer uma como introdução. 

   Já tivemos ensejo de explicar em outros posts que, conquanto a Eucaristia recorde diretamente e em primeiro lugar a Paixão de Jesus, não exclui a lembrança dos mistérios gloriosos. Jesus Cristo está no altar com a Sua vida divina que não cessa jamais, com a sua vida mortal cuja forma histórica cessou sem dúvida, mas cuja substância e merecimentos permanecem com a Sua vida gloriosa que não tem fim. 

   Para o assunto de que vamos tratar aqui, creio serem muito elucidativas duas passagens da vida de Jesus relatadas por São João no seu Evangelho. No capítulo XII, versículos 3 a 8, São João diz que seis dias antes da Páscoa, Maria (Madalena) ungiu os pés de Jesus e enxugou-os com seus cabelos. Jesus não só o permitiu mas ainda elogiou o gesto desta grande convertida. Já no capítulo XX, versículos 1 e 15 a 18, diz que, depois da Ressurreição, Maria Madalena reconhecendo a Jesus, certamente quis repetir o seu gesto costumeiro e característico. Mas Jesus lhe disse: "Não me toques, porque ainda não subi para meu Pai..." Podemos assim interpretar as palavras de Jesus: Ainda estou aqui mas agora com o corpo glorioso; por isso não me toques.
   Por ordem de Jesus, São Tomé vai tocá-Lo, mas o Apóstolo tinha sido consagrado por Jesus Cristo na  Última Ceia.
   Ora, sob as aparências do pão, temos na Eucaristia o Corpo Glorioso de Jesus. Logo, só aqueles que forem consagrados sacerdotes poderão tocá-lo para o distribuir aos comungantes.

   Consideremos outro fato também descrito por São João Evangelista: a multiplicação dos pães. São João normalmente não repete o que os sinóticos narram. Mas é interessante notarmos como antes de narrar a promessa da Eucaristia no capítulo VI, o Apóstolo que escreveu o 4º Evangelho narra imediatamente antes a multiplicação dos pães, mostrando claramente que esta seria figura da Eucaristia. O que nos interessa, no momento, na descrição da multiplicação dos pães, é o modo como Jesus distribuiu os pães bentos por Ele multiplicados: fá-lo por meio dos seus discípulos. Confiram os três sinóticos: São Mateus XIV, 19, São Marcos VI, 41 e São Lucas IX, 16. Vemos que todos os três evangelistas dizem que Jesus distribuiu os pães aos seus discípulos para que estes os servissem à multidão. São João diz que Jesus tomou os pães e distribuiu-os entre os que estavam recostados, isto é, às turbas (São João VI, 15). Entendemos que Jesus o fez através de seus discípulos como claramente dizem os outros três evangelistas.
   Ora, se na figura (a multiplicação dos pães) Jesus quis que, apesar de ser uma multidão de 5 mil pessoas, os pães só fossem distribuídos pelos discípulos, como não iria querer que a realidade (o Pão Eucarístico) fosse distribuído  somente pelos seus discípulos consagrados, que são os sacerdotes? Logo, os leigos só poderão ser ministros da Eucaristia em circunstâncias extraordinárias, como, por exemplo, foi o caso de São Tarcísio e outros semelhantes.

   Depois, a experiência tem provado, infelizmente à saciedade, que a existência de ministros leigos da Eucaristia tem propiciado inúmeras profanações e sacrilégios. Vou fazer uma hipótese. Suponhamos que um ministro e pior ainda, uma ministra da Eucaristia leve por algum tempo a comunhão aos doentes. Pois bem, se algum doente, neste ínterim, tiver cometido um pecado grave, ou descobriu que precisa fazer uma confissão geral para reparar confissões sacrílegas, terá, digo, coragem de se denunciar junto ao leigo ou leiga, ou fará comunhões sacrílegas até que um padre se digne ir visitá-lo?

   Antes de terminar quero responder a uma objeção: Se o comungante é digno de tocar Jesus com a língua, por que não poderá tocá-Lo para distribuir a Eucaristia?
   Resposta: Primeiro devemos dizer que comungamos não porque somos dignos, mas unicamente pela bondade infinita de Nosso Senhor Jesus Cristo. Depois, uma coisa é tocar em Jesus para comungar, outra é tocar em Jesus para administrar o Sacramento da Eucaristia. Jesus exige para se poder comungar que a pessoa esteja em estado de graça e tenha reta intenção. Para distribuir a comunhão exige também que esteja em estado de graça, que tenha reta intenção e também que seja consagrado para tanto. Como veremos no próximo post, Santo Tomás diz que a reverência devida a este sacramento requer que não seja tocado senão pelo que é consagrado, como são as mãos do sacerdote.
   Na hipótese desta objeção ser verdadeira, se poderia concluir que qualquer pessoa estando em estado de graça poderia apanhar a hóstia consagrada e comungar-se e também distribuir a comunhão. Aliás, estes abusos estão se tornando frequentes. Vi ontem no "Fratres in Unum" a foto da "beata" Marilena Chaui apanhando a hóstia na âmbula e comungando, enquanto o sacerdote quase em "êxtase" a contempla.

  No próximo post transcreverei os argumentos que dá Santo Tomás para provar a tese enunciada no título desta postagem. Aí toda língua se cale, tanto mais que o próprio Jesus, através do crucifixo da Capela de São Nicolau em Nápoles falara a Santo Tomás referindo-se às questões sobre a Eucaristia que ele escrevera para a Suma Teológica: "Bem escreveste de mim, Tomás, que recompensa queres?"
   

   

domingo, 22 de novembro de 2015

HOMILIA DOMINICAL - 24 domingo depois de Pentecostes

  

  Leitura da Epístola de São Paulo Apóstolo aos Colossenses, 1, 9-14.

                 Continuação do Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus, 24, 15-35:


     Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: "Quando virdes no lugar santo a abominação da desolação, que foi predita pelo profeta Daniel, quem ler, entenda. Então, os que estiverem na Judeia, fujam para os montes; e o que se achar no terraço, não desça para ir buscar coisa alguma de sua casa; e o que estiver no campo, não volte para tomar a sua túnica. Ai, porém, das que estiverem grávidas e das que amamentarem naqueles dias! Rogai, pois, que a vossa fuga não seja nem no inverno, nem em dia de sábado. Porque haverá grande aflição, qual nunca houve desde o princípio do mundo até agora, nem jamais haverá. E se estes dias não fossem abreviados, ninguém se salvaria; mas, por causa dos Eleitos, serão abreviados esses dias. Então, se alguém vos disser: Aqui está Cristo, ou Ele está ali, não lhes deis crédito. Porque, se levantarão falsos Cristos e profetas, e farão tão grandes prodígios e milagres, que (se fosse possível) até os Eleitos seriam enganados. Vede que já vo-lo predisse. Se, pois, vos disserem: Ei-lo, está no deserto, não saiais. Ei-lo, aqui, no interior da casa, não lhes deis crédito. Porque, como o raio parte do Oriente e é visível até o Ocidente, assim, será a vinda do Filho do homem. Onde quer que esteja o corpo, aí se ajuntarão as águias. Logo após a tribulação daqueles dias, o sol se escurecerá, a lua não dará mais a sua luz, as estrelas cairão do céu, e as forças do céu serão abaladas. Então, aparecerá no céu o sinal do Filho do homem vindo sobre as nuvens do céu, com grande poder e glória. E enviará seus Anjos com forte clamor de trombetas e reunirão os eleitos, dos quatro ventos, de uma à outra extremidade dos céus. Da figueira aprendei, pois, uma comparação. Quando seus ramos já estão tenros e as folhas brotam, sabeis que já está próximo o verão; assim, também, quando virdes todas estas coisas, sabei que o Filho do homem está perto, às portas. Em verdade vos digo que não passará esta geração sem que todas estas coisas se cumpram. Passará o céu e a terra, mas minhas palavras não passarão". 

   Caríssimos e amados irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo!

  Estamos no último Domingo do Ano Litúrgico. É a profecia de Nosso Senhor Jesus Cristo sobre a ruína de Jerusalém e sobre o fim do mundo.  Para boa compreensão deste Evangelho não se deve perder de vista que Nosso Senhor fala, ao mesmo tempo, da ruína de Jerusalém e do fim do mundo. Os desastres espantosos e extraordinários que assinalaram o fim do povo judeu, são apenas uma imagem da confusão e desordem que há de preceder o fim do mundo. Jesus parece ter diante de si, um só espetáculo, onde estão confundidos estes dois acontecimentos, e os pormenores que Ele profetisa, são aplicáveis, ora à tomada de Jerusalém, ora ao fim do mundo, ora aos dois fatos indistintamente.
  Em resumo Jesus Cristo ensina: que o Templo e a cidade de Jerusalém serão destruídos; que no fim do mundo (que só Deus sabe quando é) Ele voltará  em sua glória para julgar todos os homens. O Divino Mestre alerta os seus discípulos que não devem dar crédito aos falsos cristos que aparecerão e nem temer as perseguições, mas perseverar até o fim. Devem estar sempre preparados, porque o dia do juízo virá como um ladrão, quando menos se esperar. Alguns sinais, no entanto, podem indicar sua proximidade.
  Pouco depois da morte de Nosso Senhor, surgiram muitos falsos profetas que inculcavam como o Messias. Tinham por objetivo principal sublevar o povo contra a odiosa dominação dos romanos, e, entre muitos distinguiram-se Teudas que arrasta as multidões a caminho de Jerusalém, levando-as a acreditar que o Jordão se abriria à sua passagem; Barchochebas e Simão, o Mago, que multiplica simulacros de prodígios e esparge redes de enganos.
Tijolos com o nome da "X Legio" romana e com o símbolo
do javali, encontrados em Jerusalém. A X  Legio era uma das
Legiões que estavam sob o comando de Tito e que, no ano
70 d.C., destruiu Jerusalém. 
  Os Anais do historiador pagão Tácito, e as Antiguidades, de Josefo, são como que um comentário das palavras evangélicas. Aos ruídos de guerra sucede a própria guerra, guerra de morte na Palestina, em todas as regiões do Império. A esterilidade é contínua - dizia o historiador Suetônio. Perto de Nápoles. o solo tremia já com rugidos sinistros. Jerusalém e Roma estremeciam com um terremoto, e se sentia já o começo das dores, quer dizer, a perseguição, as cruzes, as bestas, as luminárias, erguidas, soltas, acesas pelo verdugos de Nero. E chega a abominação da desolação; o Templo convertido em cidadela das tropas do governador da Síria, a cidade entregue à tirania, o efod pontifical adornando o peito de um labrego, as hordas de João de Giscala fechando as portas da cidade, e Tito caminhando a marchas forçadas, para erguer à sua volta fossos, torres e muros e fazer dela o sepulcro do povo de Israel. "Jamais povo algum, - dizia Josefo - terá sofrido tantas calamidades, misturadas com tantos crimes". O próprio Tito, imperador Romano, confessava que Deus tinha combatido pelos sitiantes, cegando os judeus e arrancando-lhes os seus baluartes inexpugnáveis. Em sete meses de assédio, morreu mais de um milhão de homens, e os que ficaram foram distribuídos por todas as províncias do Império com a marca de escravos na fronte. Josefo diz que tal foi a fome, que as mães chegaram a devorar os próprios filhos. Se as desgraças do mundo inteiro desde a criação, fossem comparadas às que os judeus sofreram então, achar-se-iam inferiores a elas".
Pináculo do Templo de Jerusalém
  Segundo São Jerônimo, é preciso ter estado na Palestina para julgar da situação das suas cidades e praças, após o seu tremendo castigo. "Apenas se descobrem, diz ele, alguns vestígios de ruínas onde outrora se levantaram grandes cidades. Os pérfidos vinhateiros, depois de ter assassinado os servos, e, finalmente, o Filho de Deus, não têm mais agora o direito de entrar na cidade de Jerusalém senão para chorar, e ainda para que lhes seja permitido chorar sobre as ruínas da cidade santa, são obrigados a pagar um certa soma de dinheiro. Os que outrora tinham comprado o sangue de Jesus Cristo, compram agora as suas próprias lágrimas. Vede este povo lúgubre que chega no aniversário da tomada de Jerusalém e da sua destruição pelos romanos. Essas velhas decrépitas, estes velhos carregados de anos e andrajos, são outras tantas testemunhas da cólera de Deus. O bando miserável se reúne, e enquanto brilha o instrumento do suplício do Salvador na Igreja da Ressurreição, enquanto o estandarte da Cruz está deslumbrantemente desdobrado por sobre o monte das Oliveiras, este povo desgraçado chora sobre as ruínas do seu Templo".
  Sobre o Templo de Jerusalém Jesus dissera que não ficaria pedra sobre pedra. Esta profecia se cumpriu no ano 70, quando depois de tomarem Jerusalém, os soldados chefiados por Tito atearam fogo ao Templo. Mais tarde Juliano Apóstata, com a intenção de reedificá-lo, destruiu completamente a parte que ficara.
  Caríssimos, no próximo domingo, se Deus quiser, meditaremos mais especialmente sobre o fim do mundo e o juízo universal.


    

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

"DE SUO BONUS, DE MEO JUSTUS"

   "DEUS TIRA SUA BONDADE DE SI PRÓPRIO, E A SUA JUSTIÇA DE MIM".

   Eis o que me consola, e merece toda a minha atenção. Se eu sei usar da minha fé e aplicar bem os seus princípios, é a mesma justiça de Deus que me protege contra os temores que ela me causa. Na verdade, se eu quiser, a justiça do meu Pai que está no Céu, só será para comigo bondade, amor liberalidade. Porque enfim, não terá essa justiça, que me enche de temor, nenhum outro emprego senão o de me castigar? Não distribui também ela cem vezes com mais vontade, magníficas recompensas?

   Viva eu, ó meu Deus, submisso à vossa lei; dedique-me aos interesses da vossa glória, procure com amor cumprir fielmente os mandamentos e os deveres de meu estado! Então, poderei dizer com São Paulo, ao menos com relação ao tempo que ainda viver: "Combati o bom combate... guardei a fé; por isso tenho certeza que me está reservada a coroa da justiça, que me dará o justo Juiz (Confira II Tim. IV, 7 e 8). 

   Sim, decerto, Deus é justo; e é a sua mesma justiça que, para ter uma satisfação digna d'Ele, levou o seu amor a dar-me na pessoa de Jesus Cristo um medianeiro, que suplica e é sempre atendido; um advogado, que pede para mim perdão com autoridade e com a certeza de o obter; um Salvador, finalmente, que dá SUPERABUNDANTEMENTE, o preço do meu resgate. 

   Poço assim orar ao meu Pai do Céu: "Ouso apelar para a vossa mesma justiça. ó meu Deus, apresentando-Lhe o vosso Filho, que está em mim, pois mo destes e se entregou a si mesmo ; e por Ele e com Ele, oferecendo-Vos o meu coração culpado, mas arrependido, estou seguro da vossa misericórdia. Ouso ainda dizer-Vos: Feri-me, Senhor, se a bondade de Jesus não é infinitamente maior que a minha maldade, se o gozo que Vos dá a Sua santidade não é infinitamente maior que o horror que Vos causam os meus pecados. É portanto a vossa mesma justiça que me consola; é nela que se funda a minha esperança. Não, meu Deus, não serei confundido. É o que Vós mesmo me garantis no Salmo XXX, 2: "Em Ti, Senhor, esperei. Não permitas que eu seja jamais confundido. Livra-me segundo a tua justiça". 

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Na Eucaristia temos a virtude dos mistérios de Jesus ( I )

  Aqui não consideramos a Eucaristia como memorial, mas como fonte de graça. Meditemos profundamente este aspecto da Eucaristia.
  Nosso Senhor dá-se em alimento para conservar em nós a vida da graça. Pela união que este Sacramento estabelece entre as nossas  almas e a Pessoa de Jesus, e também pela caridade que esta união alimenta, Jesus Cristo opera em nós aquela transformação que levava São Paulo a dizer: "Vivo; mas não sou eu quem vivo, é Cristo que vive em mim" (Gal. II, 20). Esta é a virtude própria da Eucaristia. 

  Estando em graça, pela contemplação cheia de fé dos mistérios de Cristo já temos uma união com Ele. Mas, aqui na Eucaristia não pode haver união maior. Cristo dá-se para ser nosso alimento; mas ao contrário do que sucede com o alimento corporal, nós é que somos assimilados por Ele; Jesus Cristo torna-se nossa vida. 

   O primeiro fruto do maná era sustentar; a graça própria da Eucaristia é igualmente manter a vida divina da alma, fazendo-nos participar da vida de Cristo. Assim como o maná se adaptava aos desejos daqueles que o tomavam, assim também a vida que Jesus Cristo nos dá pela Comunhão é TODA A SUA VIDA,  que passa às nossas almas para ser o exemplar e a forma da nossa, para produzir em nós os diversos sentimentos do Coração de Jesus, para nos fazer imitar todas as virtudes que Ele praticou em Seus estados e derramar em nós as graças especiais que nos mereceu quando por nós viveu os Seus mistérios.      

Na Eucaristia temos a virtude dos mistérios de Jesus ( II )

   Como, já em posts anteriores sobre a Eucaristia, tivemos ocasião de demonstrar, sob as espécies eucarísticas está tão somente a SUBSTÂNCIA do corpo GLORIOSO de Jesus, tal qual está agora no Céu, e não como estava, por exemplo, no presépio de Belém. "Mas", - como disse o Beato D. Columba Marmion, - "quando o Pai contempla o Filho nos esplendores celestes, que vê n'Ele? Vê Aquele que por amor de nós viveu sobre a terra trinta e três anos; vê tudo quanto aquela vida mortal conteve de mistérios, e as satisfações e merecimentos de que estes mistérios foram origem; vê a glória que este Filho Lhe deu, vivendo cada um deles. Em cada um destes mistérios vê ainda e sempre o mesmo Filho das Suas complacências, conquanto Jesus Cristo esteja agora sentado à Sua direita no estado glorioso. Do mesmo modo, Aquele que recebemos é Jesus que nasceu de Maria Santíssima, viveu em Nazaré, pregou aos judeus da Palestina; é o bom Samaritano; é Aquele que curou os doentes, livrou Madalena do demônio e ressuscitou Lázaro; é Aquele que, cansado, dormia no barco; é Aquele que agonizava, esmagado pela angústia; é Aquele que foi crucificado no Calvário, é o glorioso ressuscitado do túmulo, o misterioso peregrino de Emaús que se dá a conhecer na fração do pão; é Aquele que subiu aos céus, à direita do Pai; é o Pontífice eterno, sempre vivo, que sem cessar intercede por nós".
   "Todos estes estados da vida de Jesus, com as suas propriedades, com o seu espírito, com os seus méritos e virtude no-los dá a Comunhão; sob a diversidade dos estados e variedades dos mistérios, perpetua-se a identidade da pessoa que os viveu e agora vive eternamente no Céu". 

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

A COMUNHÃO: Grande Meio de Santificação

   Quando comungo recebo o sacramento mais santo e o mais santificante, o que contém real e substancialmente o Autor de toda a santidade. Uma comunhão é Jesus Cristo todo, enriquecendo-me consigo mesmo. As Suas perfeições infinitas, as Suas graças, os Seus merecimentos, as Suas virtudes, tudo o que é e tudo o que tem. Quando recebo o Pão vivo descido do Céu, Jesus Cristo está todo em mim: a Sua divindade e a Sua humanidade. 

    Pertencem-me todas as Suas PERFEIÇÕES: sabedoria, poder, misericórdia, etc., e Ele mesmo vem oferecer-mas e empregá-las na minha felicidade. Caríssimos, é possível que fiquemos enfermos, quando um Deus nos oferece a cura de todos os nossos males; e indigentes, quando põe nas nossas mãos os tesouros da Sua inefável caridade?

    Pertencem-me todas as Suas GRAÇAS: Nos outros sacramentos, e pelos outros dons que me faz, eu recebo dos regatos; aqui possuo a fonte e o manancial, porque possuo o Sagrado Coração de Jesus Cristo: Não é Ele que fornece à Igreja inteira, para todos os tempos, a água que jorra para a vida eterna? Não é desta fonte inexaurível, que têm saído e sairão sempre todas as graças escolhidas?

    Pertencem-me todos os Seus MERECIMENTOS: porque é principalmente neste mistério que se firma, entre Jesus e a alma que O recebe, aquela comunicação de bens e de vida, que o mesmo Salvador compara àquela que faz que Ele e Seu Eterno Pai sejam uma e mesma coisa. Em uma palavra, pela comunhão, faço meus, todos os merecimentos de Nosso Senhor Jesus Cristo. 


   Pertencem-me todas as Suas VIRTUDES: Naquele ditoso momento em que Jesus está no comungante como Seu Pai está n'Ele; e em que lhe comunica as divinas ilustrações que Seu Eterno Pai Lhe deu, não devo já temer de aparecer na presença do Deus três vezes santo, porque Ele me verá, por assim dizer, cheio das virtudes de Seu Divino Filho. Depois de eu comungar, posso com confiança inefável dizer ao meu Pai que está no Céu: Ó meu Deus, vede a face do Vosso Jesus. Oh! quantos meios de me santificar há nas comunhões quotidianas ou ao menos frequentes que faço bem feitas, com muita fé, reverência, respeito e devoção! 

sábado, 31 de outubro de 2015

CONFISSÃO: O PROPÓSITO

   Em que consiste o propósito? O propósito consiste numa vontade firme e decidida de nunca mais pecar e de empregar todos os meios necessários para evitar o pecado.

   1 - Qualidades de um bom propósito. O propósito para ser bom deve ser: 
   a) UNIVERSAL: quer dizer que o propósito deve abranger todos os pecados mortais com a vontade de os evitar;
   2 - FIRME E EFICAZ:  entende-se que é necessário ter vontade decidida a não cometer, por motivo nenhum, o pecado mortal, e empregar todos os meios de evitar os pecados, fugindo das ocasiões perigosas, combatendo os maus hábitos, etc.
   Por maus hábitos entende-se a facilidade e forte inclinação que se experimenta de cair em certos pecados a que estamos acostumados. Para corrigi-los é preciso estar vigilante, fazer muita oração, frequentar a confissão e a comunhão e por em prática os meios e os remédios que nos propõe o confessor.
   Ocasiões perigosas de pecar são quaisquer circunstâncias que de sua natureza ou por fragilidade nossa, nos induzem e excitam a cometer o pecado.

   Um dia, Jesus foi ao Templo de Jerusalém e veio muito povo para ouvir a pregação. Jesus sentou-se a ensinar. Vieram uns fariseus, trazendo uma pobre mulher. Os fariseus disseram: Senhor, nós encontramos esta mulher a cometer adultério. A lei de Moisés manda apedrejar aqueles que cometem tal pecado. Que dizeis vós? Os fariseus perguntaram isto, para depois poder falar contra o Senhor. Jesus a princípio não respondeu nada. Virou-lhes as costas e escreveu no chão. Esta mulher tinha cometido um pecado muito grave, mas estava arrependida por medo dos castigos de Deus e não se desculpava, confessando assim o seu pecado a Jesus. A mulher tinha vontade de não pecar mais. Estes fariseus tinham cometido o mesmo pecado e talvez com mais gravidade. Jesus lhes tinha dito isto uma vez. Mas eles não tinham arrependimento, nem confessavam o seu pecado; até diziam que não tinham pecado nenhum. Os fariseus não tinham vontade de deixar de pecar: até neste momento estavam pecando, pois queriam contradizer e caluniar Jesus. Nosso Senhor via tudo isto no coração perverso destes homens. Por isso lhes virou as costas e não respondeu. Mas eles continuaram a perguntar se a deviam matar ou não. Então Jesus respondeu: "Aquele entre vós que não tem pecado atire a primeira pedra". Os fariseus ficaram com medo que Jesus contasse os seus pecados a todo o povo, e retiraram-se um após outro. E Jesus ficou no meio do povo, só com a pecadora. Então o Senhor perguntou-lhe: "Mulher, onde estão os que te acusavam? Ninguém te condenou?" - "Ninguém, Senhor" - respondeu ela, tremendo de medo: pois compreendia que Jesus não tinha pecado e receava que Ele lhe atirasse a primeira pedra. Mas o Salvador disse: "Eu também não te condenarei. Vai e não peques mais."
   "E não peques mais", disse o Senhor. Era esta a condição para não ser condenada: devia ter a vontade séria de não pecar mais. A todos os que se vão confessar, o misericordiosíssimo Salvador dá o perdão, mas com a condição de não querer mais pecar.
   Para formar o propósito servem as mesmas considerações que para a contrição, isto é, as considerações dos motivos que temos para temer a justiça de Deus e para amar sua infinita bondade. 

   No ato de contrição dizemos: "... e proponho firmemente, ajudado com o auxílio da vossa divina graça. emendar-me e nunca mais Vos tornar a ofender".

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

CONFISSÃO - A SATISFAÇÃO OU PENITÊNCIA

   I - DEFINIÇÃO: Satisfação é a reparação da ofensa feita a Deus e do prejuízo causado ao próximo.
   a) Reparação da ofensa feita a Deus: Qualquer pecado ofende a Deus, porque sempre é desobediência a Seus mandamentos. É preciso, portanto, que o homem culpado, querendo reconquistar a graça divina, ofereça uma satisfação ou desagravo, proporcionado à gravidade da ofensa. Ora, o homem, já o sabemos, é incapaz de dar compensação adequada. Felizmente, Jesus Cristo, na Cruz, satisfez plenamente à Justiça Divina, pagou a dívida devida por nossos pecados. Mas o homem tem de cooperar na Redenção de Jesus Cristo. 
   b) Reparação do prejuízo causado ao próximo: Nem todos os nossos pecados prejudicam os interesses do próximo. Mas alguns o ferem na sua pessoa, nos seus bens, na sua honra, e, então, há obrigação rigorosa de reparar. 

   II - ESPÉCIES DE SATISFAÇÃO: A satisfação pode ser: SACRAMENTAL E EXTRA-SACRAMENTAL. 
   a) Satisfação sacramental é a penitência que o padre impõe, antes da absolvição, e que o penitente promete cumprir. A essa hora basta no penitente a vontade de satisfazer, mas assim é parte ESSENCIAL do sacramento, que, portanto, ficaria inválido se faltasse esta vontade. Aliás a falta desta vontade de satisfação pelos pecados, seria sinal de falta de arrependimento.Quem está arrependido, aceita a penitência de bom grado.  Agora, o CUMPRIMENTO da penitência é só parte integrante do sacramento. Quem omitisse a penitência - por esquecimento ou descuido, tornaria o sacramento incompleto, mas não inválido. 

   b) Satisfação extra-sacramental é a que praticamos por nossa própria iniciativa, com a finalidade de melhor desgravarmos a Deus por nossos pecados. 

   III - MODO E TEMPO DE CUMPRIR A PENITÊNCIA.
   A penitência deve ser feita pelo próprio penitente. Não pode delegar outro, a não ser que o confessor dê a isso sua aprovação, como pode acontecer por exemplo em caso de esmolas. Há de cumprir-se inteira e com devoção.
   Se o confessor marcou o tempo, em que deve ser cumprida, o penitente deve fazê-la neste tempo. Caso contrário, deverá cumpri-la quanto antes e procurar fazê-la em estado de graça.
   Quando o penitente se esquece da penitência imposta, deve dizê-lo ao confessor, na confissão seguinte, e pedir-lhe outra.

   IV - RAZÃO DA PENITÊNCIA.
    Por que se impõe esta penitência? Porque ordinariamente , depois da absolvição sacramental, que perdoa a culpa e a pena eterna, fica a PENA TEMPORAL, que se há de sofrer neste mundo ou no purgatório.
   O Sacramento da Confissão, diferentemente do Batismo, não perdoa a pena temporal devida pelo pecado. Deus assim o quis, a fim de que a obrigação da satisfazer pelas nossas faltas nos sirva de freio para não recairmos. Além disso, os pecados cometidos depois do Batismo são muito mais graves, porque foram cometidos com mais perfeito conhecimento, e maior ingratidão aos benefícios de Deus. 

   V - PENITÊNCIA EXTRA-SACRAMENTAL.
   A penitência que nos dá o confessor nem sempre é suficiente para satisfazer a pena que resta, devida aos pecados. Por isso é necessário supri-la com outras penitências voluntárias. 
   As obras de penitência podem reduzir-se a três: a oração, o jejum, a esmola.
   Por oração entende-se aqui qualquer espécie de exercícios de piedade.
   Por jejum entendem-se quaisquer mortificações.
   Por esmola entende-se qualquer obra de misericórdia corporal ou espiritual.
   Contudo, a penitência que nos dá o confessor é mais meritória do que a que fazemos por nossa escolha. 
   

terça-feira, 27 de outubro de 2015

OS PERIGOS DO RELATIVISMO DOGMÁTICO

   Excerto da Encíclica "Humani Generis" de Pio XII.

   "No que se refere à teologia, alguns pretendem reduzir, quanto podem, o significado do dogma e libertar este do modo de exprimir-se, já desde muito usado na Igreja, e dos conceitos filosóficos em vigor entre os doutores católicos, para voltar, na exposição da doutrina católica, às expressões da Sagrada Escritura e dos Santos Padres. Assim esperam eles que o dogma, despojado dos elementos que dizem extrínsecos à revelação divina, possa ser proveitosamente comparado com as opiniões dogmáticas daqueles que se separam da Igreja e deste modo se possa chegar pouco a pouco à assimilação mútua do dogma católico e das opiniões dos dissidentes. Além disso, reduzida a estes termos a doutrina católica, pensam eles que desembaraçam o caminho para, com a satisfação dada às necessidades do mundo hodierno, poder exprimir o dogma com as categorias da filosofia, quer sejam do imanentismo, quer sejam do idealismo quer sejam do existencialismo ou de qualquer outro sistema. E alguns mais audazes sustentam que isso se pode fazer e se deve fazer, porque os mistérios da fé, afirmam os tais, não se podem exprimir por meio de conceitos adequadamente verdadeiros, mas somente por meio de conceitos aproximativos e sempre mutáveis, através dos quais a verdade se manifesta , sim, mas ao mesmo tempo necessariamente se deforma. Daí que não creem absurdo mas absolutamente necessário que a teologia, segundo as várias filosofias de que se sirva como de instrumentos no decurso dos tempos, substitua as noções antigas por outras novas e assim, de maneiras diversas, e até sob certos aspectos contrárias, mas - como dizem - equivalentes, traduza em linguagem humana as mesmas verdades divinas. Acrescentam que a história dos dogmas consiste em apresentar as várias formas sucessivas de que se revestiu a verdade revelada, segundo as diversas doutrinas e opiniões que no volver dos séculos foram aparacendo. 

  É claro, do que dissemos, que essas tendências não somente levam ao relativismo dogmático, mas de fato já o contêm. Relativismo esse que é por demais favorecido pelo desprezo que mostram para com a doutrina tradicional e para com os termos em que ele se exprime. Todos sabem que as expressões desses conceitos, usados tanto no ensino das aulas como no mesmo Magistério da Igreja, podem ser melhoradas e aperfeiçoados; é por outra parte bem sabido que a Igreja nem sempre usou constantemente determinadas expressões; é evidente também que a Igreja não pode estar ligada a um qualquer efêmero sistema filosófico; mas tais noções e tais expressões que com geral consenso foram através dos séculos encontradas e formuladas pelos doutores católicos para chegar a algum maior conhecimento e inteligência do dogma, sem dúvida que não se apoiam em um fundamento tão caduco. Apoiam-se, sim, em princípios e noções deduzidas de um verdadeiro conhecimento das coisas criadas; e na dedução de tais noções, a verdade, revelada como estrela, iluminou por meio da Igreja a inteligência humana. Portanto não é de maravilhar que algumas dessas noções tenham sido usadas em Concílios Ecumênicos, e que deles tenham recebido tal sanção que a ninguém é lícito afastar-se delas.

   Por esses motivos, ter em pouco caso ou rejeitar ou privar do seu justo valor conceitos e expressões que foram encontradas e aperfeiçoadas para exprimir com exatidão as verdades da fé, por pessoas de inteligência e santidade nada vulgares, num trabalho muita vez plurissecular, sob a vigilância do Magistério da Igreja, e não sem uma ilustração e direção do Espírito Santo, e querer agora substituí-las por noções hipotéticas e por certas expressões flutuantes e vagas da nova filosofia, que à semelhança da flor dos campos hoje verdeja e amanhã já secou, é por certo uma grandíssima imprudência. Seria reduzir o dogma à condição de cana agitada pelo vento. O desprezo dos termos e das noções usadas pelos teólogos escolásticos por si mesmo conduz ao enfraquecimento da teologia denominada especulativa, que tais inovadores julgam, por se apoiar em razões teológicas, desprovida de verdadeira certeza. 

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Página da História do Concílio Vaticano II - COLEGIALIDADE

COLEGIALIDADE


   (...) Mons. Staffa e os chefes do Coetus Internationalis Patrum tiveram notícia de que seus modi (=correções, observações,sugestões) tinham sido rejeitados pela subcomissão da colegialidade, ao passo que outros, que eram julgados "menos importantes", tinham sido incorporados ao texto. Mons. Staffa escreveu então ao Papa uma longa carta datada de 7 de novembro de 1964; cópias desta carta foram enviadas a doze membros particularmente ativos, que pessoalmente as transmitiram a doze Padres Conciliares pedindo-lhes para ler e assinar o documento. Este plano foi batizado de "Operação Staffa". 

   Tendo, porém, corrido a notícia de que o relatório da Comissão de Teologia sobre a revisão do esquema já estava na gráfica, teve que ser suspensa a coleta de assinaturas. Na carta enviada ao Papa, esclarecia-se que todos os que a tinham subscrito estavam convencidos de que o esquema expunha uma forma extrema de colegialidade e que eles se sentiam obrigados, em consciência, a votar Non placet. Mons. Staffa dizia que os Moderadores lhe tinham recusado ilegalmente de exercer o direito de usar a palavra. 

   Logo que recebeu a carta, o Sumo Pontífice a transmitiu à Comissão de Teologia, para que tomasse conhecimento das opiniões teológicas aí expostas, e determinou a abertura de um inquérito sobre a violação das regras de procedimento alegada por Mons. Staffa, bem como sobre vários outros casos. 

   Enquanto isto, 35 cardeais e os superiores gerais de cinco grandes ordens religiosas tinham escrito ao Papa afirmando que, aparentemente apresentando o ponto de vista liberal moderado, na realidade o texto era ambíguo e corria o perigo de ser, após o Concílio, interpretado sob o ponto de vista liberal extremo. 

   O Papa teve dificuldade de acreditar em tal coisa, e na resposta que mandou ao Cardeal cujo nome figurava em primeiro lugar na carta refutou os argumentos apresentados. Com isto, o Cardeal foi procurar o Papa em nome dos outros membros do grupo, e lhe apresentou as razões de suas dúvidas. O Papa não deu prosseguimento às diligências.

   O Cardeal sugeriu então que fosse permitido aos teólogos de seu grupo discutir a questão, em presença do Papa, com seus teólogos pessoais, mas o Sumo Pontífice não aceitou. Pediu contudo ao Cardeal que dissesse os nomes dos teólogos de seu grupo e logo que ele citou três nomes, o Papa não escondeu seu espanto, pois tratava-se de teólogos muito conhecidos e por quem ele tinha grande apreço. Mais uma vez ele não tomou qualquer medida, e se contentou em recordar que o texto sobre a colegialidade tinha sido aprovado pela maioria requerida. "Antes de votar", disse, "os Padres Conciliares não podiam ter deixado de estudar de modo bastante profundo a questão, nem de se preparar pela oração." Desculpando-se, o Cardeal declarou que não podia se associar inteiramente àquele modo de ver. Mas o Papa não agiu, tão grande era a confiança que depositava na Comissão de Teologia.

   Foi então que um dos liberais extremistas cometeu o erro de fazer referência por escrito a algumas das passagens ambíguas e de esclarecer como seriam interpretadas após o Concílio. O documento caiu nas mãos do grupo de cardeais e superiores maiores de que acabamos de falar, e seu representante foi levá-lo ao Sumo Pontífice. Compreendendo então que tinham se aproveitado dele, Paulo VI caiu em si e chorou. 

   Qual seria o remédio? (...) Esta foi a origem da "Nota Explicativa Prévia" - Nota Explicativa Preliminar - publicada como apêndice ao esquema. (...)

   (...) (A ambiguidade, que agora fora afastada, tinha sido apontada desde a segunda sessão pelo Cardeal Ottaviani, na ocasião em que ele tinha feito tão vigorosa oposição à redação de quatro pontos submetidos à votação pelos Cardeais Moderadores, em 30 de outubro de 1963. 

   N.B. 1ª - Uma Nota prévia ou preliminar colocada como apêndice (!!!). Os Padres liberais devem ter considerado esta Nota Explicativa Prévia um nariz de cera e que deveria ser colocado não na cara, mas na nuca. 
       2ª - Pela História do Concilio Vaticano II e sobretudo pelos frutos do mesmo, podemos concluir que teriam sido necessárias não uma mas inúmeras Notas Explicativas neste Concílio. Imaginem se os mais de 2000 Padres Conciliares Liberais tivessem dado a mancada providencial que deu aquele Cardeal que pela sua sinceridade (querida ou não, só Deus o sabe) provocou o choro e a Nota Explicativa Prévia do Papa Paulo VI.


Página da História do Concílio Vaticano II

   "Quando no começo da segunda sessão, Paulo VI recebeu em audiência os observadores e convidados, o Cardeal Bea pôde anunciar que o número deles passara de 49 para 66, e o de igrejas ou comunidades representadas, de 17 para 22.

   O observador da Federação Luterana Mundial, Dr. Kristen Skydsgaard, dirigiu-se ao Papa em francês, em nome de todos os observadores e convidados presentes, e falou 'De sua profunda gratidão pela renovação do convite para a segunda sessão do Concílio." ... "Nós estamos juntos, acrescentou, no começo de um caminho cujo termo só Deus conhece".

   Em resposta, o Papa exprimiu "seu desejo de receber os observadores e convidados não só dentro de sua casa, mas no próprio coração de sua intimidade" Depois de lhes agradecer por terem aceito o convite para assistir à segunda sessão, prosseguiu: "Ficai certos de nosso respeito, de nossa estima e de nosso desejo de manter convosco, em Nosso Senhor, as melhores relações possíveis. Nossa atitude não esconde nenhuma armadilha, não cede a nenhuma intenção de dissimular as dificuldades em prol de um acordo completo e definitivo; ela não receia a delicadeza da discussão, nem o sofrimento da espera". Quanto ao histórico da separação, ele preferia concentrar sua atenção "não sobre o que foi, mas sobre o que deve ser. Nós nos voltamos, disse, para uma novidade a engendrar, um sonho a realizar".

   No dia seguinte, 18 de outubro, o Cardeal Bea ofereceu uma recepção aos observadores e convidados. Dirigindo-se a eles em francês, solicitou-lhes críticas, recordando-lhes as palavras que o Sumo Pontífice pronunciara diante da Cúria Romana algumas semanas antes: "Devemos acolher com humildade, reflexão, e mesmo com reconhecimento, as críticas que nos são feitas; Roma não precisa se defender; não deve permanecer surda às sugestões que lhe vêm de vozes honestas, e muito menos quando estas vozes são de amigos e de irmãos". O Cardeal garantiu aos observadores e convidados que seria dada a maior atenção às suas críticas positivas, suas sugestões e desejos.

   O Arcipreste Vitali Borovoï, observador-delegado da Igreja Ortodoxa Russa e da Igreja Ortodoxa da Geórgia .... "Estamos sempre prontos, disse, a ajudar nossos irmãos católicos romanos em tudo que possa concorrer para a reaproximação e para a união entre todos os cristãos, para que possamos, a uma só voz e com um só coração, glorificar juntos o Espírito Santo". (...)

   O chefe da delegação anglicana, o Bispo  Ripon (John Moorman) teve a cortesia de me expor seu ponto de vista pessoal sobre o primado e a colegialidade: "A Igreja Católica Romana ganharia muita força, se o princípio da colegialidade dos bispos fosse aceito, e se chegasse a um sistema que permitisse a bispos representantes do mundo inteiro constituir com o Papa um concílio permanente". Para ele, isto constituiria "uma melhora com relação ao atual sistema em vigor de uma Cúria de expressiva maioria italiana". 

   Os observadores-delegados e os convidados mostraram particular interesse pelo esquema sobre o ecumenismo, que foi tratado na 69ª Congregação Geral, em 18 de novembro. (...)

   Mons. Morcillo González, Arcebispo de Saragoça, disse que uma das admiráveis qualidades do esquema era seu "tom positivo", resultante da redução do número de advertências e do total desaparecimento das condenações que tinham caracterizado os documentos precedentes sobre o assunto. Não seria conveniente, sublinhou ele, que a Igreja Católica, "recusasse aceitar a colaboração oferecida atualmente por nossos irmãos separados com vistas a resolver esta questão tão importante". 

   O Cardeal de Arriba y Castro, Arcebispo de Tarragona, disse que podia ser muito perigoso "para nossa fé de católicos, sobretudo para aqueles de condição modesta, que frequentemente não estão preparados para responder aos argumentos apresentados pelos especialistas de diversas seitas e confissões", incentivar o diálogo como ele achava que o esquema fazia. Disse que existiam inúmeras provas de que o proselitismo protestante estava crescendo. Em consequência, pediu aos Padres Conciliares "para incluírem no esquema um pedido dirigido aos irmãos separados para que se abstenham de todo proselitismo entre os católicos, por medo de que a fé de nossos fiéis se obscureça pela confusão". [Este não foi aplaudido].

N.B. Creio ser interessante notar os que foram aplaudidos e os que não foram aplaudidos no CVII. 

Página da História do Concilio Vaticano II - COLEGIALIDADE

    "Mons. D'Souza, Arcebispo de Bhopal, criticou os Cardeais Browne e Ottaviani por raciocinar como se a votação indicativa de 30 de outubro 'fosse nula ou inexistente porque a colegialidade ainda não tinha sido definida juridicamente(...) O bem comum da Igreja, continuou o Arcebispo, seria grandemente servido 'se uma forma de Senado, por assim dizer, se constituísse de bispos de diversos países, e pudesse governar a Igreja com o Sumo Pontífice'. Mas seria ainda mais desejável, 'que, de um lado se restringisse o poder da Cúria Romana, e de outro lado os bispos recebessem, para o desempenho de seu ofício, todas as faculdades que lhes pertencem por direito comum e por direito divino'. A Sé apostólica, acrescentou, 'conservaria o direito de reservar para si os casos que o bem da Igreja Universal pede que ela retenha'. Esta intervenção foi longamente aplaudida. (...) 

   Eu (ou seja, o autor Padre Ralph Wiltgen S.V.D.) tinha uma entrevista com o Cardeal Ottaviani na casa dele, para esclarecer um assunto. Entrando no recinto, ele se sentou e depois, com um ar preocupado e ausente, me disse: 'Estou saindo de uma reunião da Comissão de Teologia. As coisas estão ficando ruins; os franceses e os alemães conseguiram unir todo o mundo contra nós (...)'

   Dez dias após o embate Frings-Ottaviani, ao qual a imprensa deu grande destaque, fui abordado por Mons. Romoli, Bispo dominicano de Pescia, que passara oito anos no Santo Ofício. Ele me perguntou se eu tinha interesse em uma informação para o Divine Word News Service sobre o relatório do procedimento de condenação seguido pelo Santo Ofício. Tinha informado sua intenção ao Cardeal Ottaviani, que ficara de acordo. Eu (Padre Ralph) lhe garanti que publicaria a informação com prazer.

   Perguntando-lhe se era verdade que o tribunal supremo da Igreja condenava um acusado sem o ter ouvido previamente, Mons. Romoli me respondeu: 'É preciso distinguir. Se um membro da Igreja acusa outro de um crime de competência do Santo Ofício, o acusado é sempre ouvido, e tem toda possibilidade de se defender. Ele pode ter a assistência de um advogado aprovado pelo tribunal. As precauções tomadas para salvaguardar o acusado neste caso são tão grandes e minuciosas que poderiam talvez parecer excessivas'.

   Mas, observou, é completamente diferente no caso de condenação de obras publicadas, 'pois aí se trata de teorias que, consideradas em si mesmas, trazem o risco de prejudicar a integridade da doutrina de Igreja e a salvação das almas'. Nestes casos, acrescentou, 'quando a ortodoxia da doutrina católica não é claramente exposta, ou é posta em questão, o Santo Ofício não ouve sempre a parte interessada antes de pronunciar o veredicto'. Neste gênero de condenação, disse ele, não são as intenções do autor que são postas em questão ou condenadas; o tribunal leva em consideração apenas suas teorias consideradas em si mesmas.

   Perguntado se não seria mais humano questionar um autor antes de lhe condenar os escritos, Mons. Romoli respondeu que isto seria perfeitamente possível no caso de um manuscrito ainda não publicado. 'Mas, uma vez difundidas as doutrinas erradas ou falsas, para que serviria um tal interrogatório?' Em nada mudaria quanto à influência exercida pela obra publicada sobre o mundo católico. 'Antes de condenar uma obra publicada ou de difundir um solene Monitum a seu respeito, o Santo Ofício leva a efeito uma longa investigação séria e escrupulosa, consultando especialistas altamente qualificados pertencentes a grupos linguísticos e nacionais diversos, para que seu julgamento seja incontestavelmente objetivo e certo. Acontece que estas investigações duram vários anos, tão grande é a delicadeza com que o Santo Ofício trata esta matéria'.  

Página da História do Concilio Vaticano II - ( 14ª página)

   "Na mente de numerosos Padres Conciliares, o objetivo do II Concílio do Vaticano era contrapor-se à doutrina do primeiro sobre o primado papal, expondo de modo mais explícito a doutrina da colegialidade episcopal. (...) A colegialidade devia estabelecer o direito dos bispos de regê-la [a Igreja] em união com o Papa. (...) Entre os partidários da Aliança Européia, alguns teólogos sustentavam que o Papa tinha a obrigação de consciência de consultar o Colégio de Bispos quando tivesse que tratar de assuntos importantes. Mas nem todos os Padres Conciliares tinham esta opinião. (...).

   A votação que se realizou em 30 de outubro constituiu uma nova vitória para os liberais. Mons. Wright, Bispo de Pittsburg, nos Estados Unidos, membro liberal da Comissão de Teologia, disse que esta votação era da maior importância, pois provava que a maioria esmagadora dos Padres Conciliares 'era partidária das tendências do Concilio sobre esta grave questão'. Ele não dava nenhuma importância aos 408 votos negativos que se tinham pronunciado contra a colegialidade. (...).

  ... O Cardeal Frings pediu que os dois aspectos - administrativo e judiciário - da prática da Cúria Romana tivessem clara distinção. 'A mesma distinção igualmente deve ser aplicada ao Santo Ofício', prosseguiu ele. 'Em frequentes casos, seus métodos não correspondiam mais às condições modernas, e o resultado é que muitos ficam escandalizados'. A tarefa de conservar a Fé era extremamente difícil, continuou o Cardeal, mas, mesmo no Santo Ofício, 'ninguém deveria ser julgado e condenado sem ser ouvido e sem ter a possibilidade de corrigir a própria obra ou ação'. O Cardeal foi aplaudido repetidas vezes.

   O Cardeal Ottaviani, secretário do Santo Ofício, inscrevera-se naquele dia na lista dos oradores. 'Eu me sinto obrigado a protestar energicamente contra o que acaba de ser dito contra o Santo Ofício, cujo Prefeito é o Soberano Pontífice. As palavras que acabam de ser pronunciadas provam uma grande ignorância - por respeito, abstenho-me de empregar outro termo - sobre o modo de proceder do Santo Ofício'. Ele esclareceu que os especialistas das universidades católicas de Roma eram sempre solicitados a examinar cuidadosamente os casos, de modo que os cardeais que constituem a Congregação do Santo Ofício pudessem julgar com conhecimento de causa. Em seguida, tais resoluções eram submetidas à aprovação do Sumo Pontífice.

   Quanto à votação de 30 de outubro, ela somente tinha dado 'uma indicação da opinião dos Padres Conciliares'. Era de se lastimar, prosseguiu, que os pontos propostos pelos quatro Moderadores não tivessem sido previamente submetidos à Comissão de Teologia, que era competente na matéria, já que se tratava de dogma. Tais pontos continham expressões equívocas que deviam ter sido esclarecidas. Por exemplo: o que se dizia da colegialidade presumia a existência do Colégio Apostólico, do qual o Colégio de Bispos deveria ser sucessor. 'Há neste ponto, disse o Cardeal, confusão sobre a natureza da sucessão apostólica. É certo que os bispos são sucessores dos Apóstolos, mas eles não sucedem ao Colégio dos Apóstolos como Colégio, pela simples razão de que o Colégio dos Apóstolos, ao menos no sentido jurídico, não existia como tal'. Houve entre os Apóstolos um único exemplo de colegialidade, o do Concílio de Jerusalém: ninguém punha em dúvida que aí os Apóstolos agiram colegiadamente, 'exatamente como hoje ninguém duvida que os bispos, reunidos em Concílio, ajam colegiadamente com e sob o Papa'. As palavras de Cristo: 'Apascenta meus cordeiros' só foram dirigidas apenas a seu vigário e 'daí se conclui que quem quer ser contado no número dos cordeiros de Cristo deve estar submetido ao pastor universal designado por Cristo'. Ninguém pode ser exceção a esta regra: 'nem mesmos os bispos'. 

domingo, 11 de outubro de 2015

Que é a Tradição?

Extraído do capítulo XVII da "CARTA ABERTA AOS CATÓLICOS PERPLEXOS" escrita por D. Marcel Lefebvre em 4 de julho de 1984.

   "Parece-me que, com frequência, a palavra é imperfeitamente compreendida: comparam-na às tradições como existem nas profissões, nas famílias, na vida civil: o buquê fixado sobre a cumeeira da casa quando se coloca a última telha, a fita que se corta para inaugurar um monumento, etc. Não é disto que eu falo; a Tradição, não são os costumes legados pelo passado e conservados por fidelidade a este, mesmo na ausência de razões claras. A Tradição se define como o depósito da Fé transmitido pelo magistério de século em século. Este depósito é aquele que nos deu a Revelação, isto é, a palavra de Deus confiada aos Apóstolos e cuja transmissão é assegurada por seus sucessores.

   Ora atualmente, se quer pôr todo o mundo em pesquisa "como se o Credo não nos tivesse sido dado, como se Nosso Senhor não tivesse vindo trazer a Verdade, uma vez por todas. Que se pretende encontrar com toda esta pesquisa? Os católicos a quem se quer impor "reconsiderações", após se lhes ter feito "esvaziar suas certezas", devem lembrar-se do seguinte: o depósito da Revelação terminou no dia da morte do último Apóstolo. Acabou, não se pode mais nele tocar até a consumação dos séculos. A Revelação é irreformável. O Concílio I do Vaticano relembrou-o explicitamente: "a doutrina de fé que Deus revelou não foi proposta às inteligências como uma invenção filosófica que elas tivessem que aperfeiçoar, mas foi confiada como um depósito divino à Esposa de Jesus Cristo (Igreja) para ser por Ela fielmente conservada e infalivelmente interpretada".

   Mas, dir-se-á, o dogma que fez Maria a mãe de Deus não remonta senão ao ano de 431, o da transubstanciação a 1215, a infalibilidade pontifícia a 1870 e assim por diante. Não houve aí uma evolução? De modo nenhum. Os dogmas definidos no curso das idades estavam contidos na Revelação, a Igreja simplesmente os explicitou. Quando o Papa Pio XII definiu, em 1950, o dogma da Assunção, ele disse precisamente que esta verdade da transladação ao céu da Virgem Maria com seu corpo se encontrava no depósito da Revelação, que ela existia já nos textos que nos foram revelados antes da morte do último Apóstolo. Não se pode trazer nada de novo neste domínio, não se pode acrescentar um só dogma, mas exprimir os que existem duma maneira sempre mais clara, mais bela e mais grandiosa.

   Isto é tão certo que constitui a regra a seguir para julgar os erros que se nos propõem quotidianamente e para rejeitá-los sem nenhuma concessão. Bossuet o escreveu com energia: "Quando se trata de explicar os princípios da moral cristã e os dogmas essenciais da Igreja, tudo o que não aparece na tradição de todos os séculos e especialmente na Antiguidade, é por isso mesmo não somente suspeito mas mau e condenável; e é o principal fundamento sobre o qual todos os santos Padres (da Igreja) e os papas mais que os outros, condenaram falsas doutrinas, não havendo nada de mais odioso à Igreja romana que as novidades".

   O argumento que se faz valer aos fiéis aterrorizados é este: "Vós vos agarrais ao passado, sois passadistas, vivei com vosso tempo!" Alguns desconcertados, não sabem o que responder; ora, a réplica é fácil: aqui não há nem passado nem presente, nem futuro, a Verdade é de todos os tempos, ela é eterna.

   Para difamar a Tradição, opõe-se-lhe a Sagrada Escritura, à maneira protestante, afirmando que o Evangelho é o único livro que conta. Mas a Tradição é anterior ao Evangelho! Se bem que os Sinópticos tenham sido escritos bem menos tardiamente do que se tenta fazer crer, antes que os Quatro tivessem terminado a sua redação, passaram-se vários anos; ora a Igreja já existia, tinha havido Pentecostes, acarretando numerosas conversões, três mil no mesmo dia, ao sair do Cenáculo. Em que acreditaram eles naquele momento? Como se fez a transmissão da Revelação a não ser por tradição oral? Não se poderia subordinar a Tradição aos Livros Santos e com mais forte razão recusá-la.

   Mas não creiamos que, fazendo isto, eles tenham um respeito ilimitado pelo texto inspirado. Eles (os progressistas) contestam mesmo que ele o seja na sua totalidade: "O que há de inspirado no Evangelho? Somente as verdades que são necessárias à nossa salvação.". Por conseguinte os milagres, os relatos da infância, os acontecimentos e atos de Nosso Senhor são remetidos ao gênero biográfico mais ou menos lendário. No Concílio Vaticano II discutiu-se sobre esta frase: "Apenas as verdades necessárias à salvação"; havia bispos que queriam reduzir a autenticidade histórica dos evangelhos, o que mostra a que ponto o clero estava gangrenado pelo neo-modernismo. Os católicos não se devem deixar iludir: todo o Evangelho é inspirado; os que o escreveram tinham realmente sua inteligência sob a influência do Espírito Santo, de tal sorte que a totalidade é a palavra de Deus. Verbum Dei. Não é permitido escolher e dizer hoje: "Nós tomamos tal parte, nós não queremos tal outra. "Escolher é ser herético, segundo a etimologia grega da palavra.

   Não é menos verdade que é a Tradição que nos transmite o Evangelho, e pertence à Tradição, ao Magistério, explicar-nos o que há no Evangelho. Se não temos ninguém para no-lo interpretar, podemos ser muitos a compreender dum modo inteiramente oposto a mesma palavra de Cristo. Desemboca-se então no livre exame dos protestantes e na livre inspiração de todo este carismatismo atual que nos lança na pura aventura.

   Todos os concílios dogmáticos nos deram a expressão exata da Tradição, a expressão exata do que os Apóstolos ensinaram. E irreformável. Não se podem mais mudar os decretos do Concílio de Trento, porque eles são infalíveis, escritos e baixados por um ato oficial da Igreja. à diferença do Vaticano II cujas proposições não são infalíveis, porque os papas não quiseram comprometer sua infalibilidade. Ninguém então vos pode dizer: "Vós vos agarrais ao passado, permanecestes no Concílio de Trento". Porque o Concílio de Trento não é o passado! A Tradição se reveste dum caráter intemporal, adaptado a todos os tempos e a todos os lugares. 

   

domingo, 4 de outubro de 2015

OS IDEAIS DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS ( 1 )

   Todos sabemos que a meditação da vida de São Francisco de Assis constitui um verdadeiro banho de humildade e de desprendimento dos bens terrestres; e mais do que isto: um banho de amor às humilhações e à efetiva santa pobreza. São Francisco não procurou forjar um  Evangelho ao "modus vivendi" da época. Procurou vivê-lo na sua genuinidade íntegra. Em outras palavras, esforçou-se por fazer de Jesus Cristo o centro de sua vida. Foi assim que logrou com a graça de Deus, ser uma cópia do próprio Nosso Senhor Jesus Cristo. Não dissera o Divino Mestre: "Sede perfeitos como Vosso Pai do Céu é perfeito"? Jesus Cristo é, na verdade, a causa eficiente e também exemplar de toda santidade. Imitando-O, chega-se, o quanto é possível a mera criatura, à perfeição de Deus. 

   Francisco, na juventude, mesmo antes do que ele próprio chama "sua conversão", distinguiu-se por três qualidades: pureza de costumes, desprezo pelos bens puramente materiais e espírito cavaleiresco.

   Pureza de costumes:  "Ele era, diz Tomás Celano, naturalmente e por força de uma generosa resolução, cortês nos modos e na linguagem. Ninguém lhe ouviu jamais uma palavra ofensiva ou vergonhosa. Por muito alegre e brincalhão que fosse, propusera-se nunca responder a gracejos pouco delicados. Por isso o tinham em alta estima na província, e muitos dos que o conheciam asseveravam que ele viria a ser um dia um grande homem". (Thom. Cel., II, n. 3). Dizem os seus biógrafos que em nenhuma parte se encontra , neste período da sua existência, indício de que qualquer falta haja perturbado a sua consciência.

   Desprezo pelas riquezas: "Era, diz Celano, o primeiro nos jogos, nas facécias e anedotas, nas conversas fúteis e cantilenas, no vestir roupas cômodas e largas, muito rico, nada avarento, antes pródigo, longe de entesourar, dissipava a sua fortuna; muito prudente, quando tratava dos negócios, fora deles distribuía a mancheias o dinheiro" (Thom. Cel. I, n. 2). Mostrava-se gastador consigo e com os seus amigos, com os pobres e os necessitados. (Tres Socii, n. 2).

  Alma verdadeiramente cavaleiresca: Bem cavaleirosa era a inclinação que impelia insistentemente o jovem Francisco para as expedições militares, em que é necessário empregar violentos esforços e até expor-se a ferimentos e à morte. Tinha cerca de vinte anos quando tomou parte na terrível guerra que estalou entre Assis e Perúgia; aí foi feito prisioneiro, com muitos dos seus companheiros de armas. Durante o ano que lhes durou o cativeiro, venceu a todos em coragem cavaleirosa. Não perdeu por um momento o seu bom humor, e até se ria, a gosto da sua enxovia e dos seus ferros. Sempre conseguiu, como é próprio de um amável cavaleiro, levantar o moral dos prisioneiros, fazer voltar à ordem os espíritos turbulentos e dirimir as questões que entre eles se desencadeavam. 

  A "conversão" de Francisco vai ser preparada por Deus através de uma doença de mais de um mês, que lhe alquebrará ao mesmo tempo o corpo e a alma. Nosso Senhor Jesus Cristo vai tirar do coração de Francisco seu apego às alegrias do mundo, e vai transformar, no ideal de Francisco, a cavalaria terrestre em cavalaria espiritual, assim como bem mais tarde irá fazê-lo com Inácio de Loiola.
   Depois desta doença, quando entrou em convalescença - provavelmente aos 23 anos de idade - e, apoiado a uma bengala, saiu de casa pela primeira vez, o mundo tinha perdido para ele todo o encanto de outrora. Percebeu que uma grande mudança se operara nele. Admirava-se desta mudança de coisas, e, desde que recobrou as forças, tentou esquivar-se à mão divina. Assaltado de projetos terrenos, pôs-se a caminho para a Apúlia, à cata de aventuras. E, quanto mais avançava, mais pensativo se tornava. Chegado que foi a Espoleto, deu-lhe Deus ordem de regressar a Assis, onde lhe seria indicado o que teria a fazer. Era tão formal a ordem divina, que Francisco tomou imediatamente o caminho da cidade natal. (Cf. Tres Socii, n. 6). Mal chega a casa, já os amigos o impelem à organização de uma de suas festas. A princípio hesitou, mas depois acabou aceitando o convite. Após o festim magnífico, espalhou-se o alegre bando, a cantar como tantas vezes o fizera antes, pelas ruas de Assis. Francisco, empunhando o cetro de rei da festa, ia a certa distância, silencioso e recolhido. De repente, recebe a visita de Deus: tal doçura invade sua alma que, insensível às coisas exteriores, detém-se sem voz, sem movimentos. (Cf. Tres Socii, n. 7). A partir desta hora, mostrou-se mais meditativo e mais interior. Logo se sentiu tomado de tédio, não só por si como também por tudo quanto amara até então. É evidente que isso não se deu senão aos poucos, uma vez que não se achava ainda de todo libertado das vaidades do mundo. Mas ia fugindo cada vez mais ao tumulto dos negócios, procurava o comércio de Deus e dirigia-se todos os dias para uma gruta solitária, fora da cidade, arrebatado por uma força irresistível e acalentado por uma divina suavidade. Experimentava, no entanto, indizíveis sofrimentos e projetos tumultuavam-lhe no espírito e aí levantavam tempestades. Examinava-os, para depois os aprovar ou rejeitar. Ardendo em fervor e em santas resoluções para o futuro, consumia-se em aflições pela sua vida passada. Que devia renunciar inteiramente ao mundo e empenhar-se, sem reservas no serviço de Deus, isso o sabia ele muito bem, mas era tudo.

 No próximo post, falaremos de sua "conversão".


OS IDEAIS DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS ( 2 )

   "Um dia, escreve Tomás Celano, - estava Francisco então com os seus vinte cinco anos - depois de haver implorado com plena confiança a misericórdia de Deus, mostrou-lhe o Senhor o que tinha a fazer. Foi tão grande a sua alegria, que não pôde conservar ocultos por mais tempo os sentimentos do seu coração. Não falava, entretanto, da sua felicidade, senão de um modo enigmático, de modo que o povo dizia: "Sonha com um precioso tesouro que espera descobrir ou pensa então em casar-se". E, de ordinário, respondia ele: "Sim, mas aquela com quem me casarei é tão nobre, tão rica e bela, que não há igual no mundo". "E, de fato, - nota Celano - a Ordem que ele funfou é a esposa imaculada de Deus e o reino do céu é esse precioso tesouro que ele tão ardentemente procurou. Efetivamente, era necessário que atendesse plenamente à vocação evangélica aquele que devia ser ministro do Evangelho na fé e na verdade". Vamos ouvir o próprio Francisco no começo de seu Testamento:

   "O Senhor me deu a mim, Frei Francisco, a graça de começar assim a fazer penitência: estava em pecados e me parecia muito amargo ver leprosos; e o próprio Senhor me levou ao meio deles, e eu usei de misericórdia para com eles. E, quando me retirei de sua presença, o que me tinha parecido amargo, mudou-se para mim em doçura da alma e do corpo.

    E depois, pouco demorei e saí do século. E o Senhor me deu uma tão grande fé nas igrejas, que chegava a adorar assim com simplicidade e dizia: "Nós vos adoramos, Santíssimo Senhor Jesus Cristo, aqui e em todas as vossas igrejas que se erguem por todo o mundo, e nós vos bendizemos, por haverdes remido o mundo com a vossa santa cruz".

   Em seguida, o Senhor me deu e me dá ainda uma tão grande fé nos padres que vivem consoante a Santa Igreja Romana, por causa do seu caráter, que, se eles me perseguissem, seria a eles mesmos que eu desejaria recorrer. 

   E depois que o Senhor me deu Irmãos, ninguém me mostrou o que devia fazer e o Altíssimo me revelou que eu devia viver conforme o Santo Evangelho. E assim o mandei escrever em poucas palavras e simplesmente, e o senhor Papa mo confirmou". 

   COMO NASCEU A ORDEM FRANCISCANA: Era em 24 de Fevereiro de 1209. Francisco assistia, na Porciúncula, ao santo sacrifício da Missa. Ao Evangelho ouviu ler as palavras que Nosso Senhor dirigira aos Apóstolos, mandando-os pregar. Depois da Missa, foi pedir explicação ao celebrante, e este lha deu ponto por ponto. Quando Francisco soube que o discípulo de Cristo não devia possuir ouro, nem prata, nem qualquer moeda; nem levar em viagem alforje, nem bolsa, nem bastão; nem ter sapatos, nem duas túnicas; mas pregar o reino de Deus e a penitência, exultou em espírito e exclamou: "Eis aí está o que eu quero! Eis o que procuro e desejo fazer, de todo o meu coração". e naquele mesmo instante se descalça, joga fora o bastão que trazia, substitui por uma corda o cinto de couro e faz uma roupa de pano grosseiro sobre a qual cose uma cruz. Com a mesma ligeireza e o mesmo respeito, pôs em prática todos os conselhos que ouvira durante a Missa. "Porque não era daqueles que ficam surdos aos conselhos evangélicos; mas, confiando à sua memória tudo o que aprendera, esforça-se por cumpri-lo à risca". (T. Celano e São Boaventura). 
   Algumas semanas mais tarde, juntaram-se-lhes os primeiros companheiros. Francisco abriu, ao acaso, por três vezes, o Livro Santo, e, de cada vez, lhe caiu debaixo dos olhos a passagem referente à missão dos Apóstolos. Viu neste fato uma indicação providencial, e, voltando-se para os discípulos, disse-lhes: "Meus irmãos, eis aí com será a nossa vida e a nossa Regra; como será também a vida e a Regra de todos aqueles que, para o futuro, se quiserem juntar a nós. Ide, pois, e fazei como acabais de ouvir". Era em 16 de Abril de 1209. Nesse dia, nasceu a Ordem Franciscana. 
   

OS IDEAIS DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS ( 3 )

  O ideal de São Francisco de Assis no atinente a Santíssima Eucaristia, podemos ver pela carta que escreveu aos Clérigos. Ei-la:

    "Consideremos todos nós clérigos o grande pecado e ignorância que alguns manifestam com relação ao Santíssimo Corpo e Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo e seu santíssimo nome e palavras escritas que tornam santamente presente o Corpo (de Cristo). Sabemos que o Corpo não pode estar presente se antes não for tornado presente pela palavra. Pois nada temos nem vemos corporalmente dele, do próprio Altíssimo, neste mundo, senão o Corpo e Sangue, os nomes e as palavras pela quais fomos criados e remidos da morte para a vida. 

   Logo, todos aqueles que administram tão sacrossantos mistérios e especialmente aqueles que os ministram sem a reta discrição, considerem no seu íntimo como são vulgares os cálices, corporais e panos de linho sobre as quais é oferecido em sacrifício em lugares bem comuns e o levam de modo lamentável (pela rua) e o recebem indignamente e o ministram indiscriminadamente. Igualmente os seus nomes e palavras escritas são às vezes calcadas aos pés; pois "o homem animal não percebe as coisas de Deus" (1Cor. 2, 14).

   Não excitam porventura tais fatos a nossa piedade e devoção por esse bom Senhor quando se digna de vir colocar-se ele próprio em nossas mãos e nós o tocamos e o recebemos todos os dias em nossa boca? Ou ignoramos que um dia havemos de cair em suas mãos?

   Emendemo-nos pois depressa e firmemente dessas e de outras faltas. Onde quer que o Santíssimo Corpo e Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo for conservado de modo inconveniente ou simplesmente deixado em alguma parte, que o tirem dali para colocá-lo e encerrá-lo num lugar RICAMENTE ADORNADO.(Destaque meu).  De modo igual sejam recolhidos e colocados em lugar decente os nomes e palavras escritas do Senhor sempre que forem encontradas em lugares imundos. Sabemos perfeitamente que estamos estritamente obrigados a observar tudo isto, em virtude dos mandamentos do Senhor e dos preceitos da santa Mãe Igreja; e os que o não fazem saibam que deverão prestar contas perante Nosso Senhor Jesus Cristo no dia do Juízo. 

   E os que mandarem copiar esta carta a fim de que seja mais amplamente observada saibam que serão abençoados por Deus, Nosso Senhor. 

sábado, 12 de setembro de 2015

O SACRAMENTO DO MATRIMÔNIO

DEFINIÇÃO E EXPLICAÇÃO DOS TERMOS

   I - DEFINIÇÃO: É um sacramento instituído por Nosso Senhor Jesus Cristo, que estabelece uma união santa e indissolúvel entre o homem e a mulher, e lhes dá a graça de se amarem um ao outro santamente, e de educarem cristãmente seus filhos.

   II - EXPLICAÇÃO DOS TERMOS DESTA DEFINIÇÃO:
   
   1º - Um sacramento... Deus instituiu o matrimônio já no Paraíso Terrestre, quando apresentou Eva como esposa a Adão. Jesus Cristo elevou-o à dignidade de sacramento. Para os cristãos não há matrimônio que não seja sacramento; e se não for sacramento, não é tampouco verdadeiro matrimônio.

   2º - Que estabelece uma união santa e indissolúvel entre o homem e a mulher: é uma união santa porque foi feita pelo próprio Deus: "Não separe o homem o que Deus uniu". E a união do matrimônio é indissolúvel, isto é, é tal que ninguém a pode dissolver: marido e mulher estão reciprocamente unidos para toda a vida. Os casados sê-lo-ão sempre perante Deus, embora, por desgraça, se separem; por isso nenhum deles, enquanto o outro vive, pode passar a segundas núpcias. A união do matrimônio perfeito é tão indissolúvel que nem o Papa, que tem poder amplíssimo, a pode desfazer. Daqui se compreende como o divórcio entre os cristãos é coisa que nenhuma autoridade pode permitir e, portanto, os divorciados que se casam com outros não serão e nunca poderão ser verdadeiros esposos. Só a morte de um cônjuge dissolve a união do matrimônio.
   Deus quis esta união indissolúvel, porque os males que traz o divórcio, são imensamente mais numerosos e graves do que aqueles que pretende remediar, e porque a união dos esposos no matrimônio significa a de Jesus Cristo com a Igreja, sua esposa e nossa mãe, unida a Ele indissoluvelmente. 

   3º - E lhes dá a graça de se amarem um ao outro santamente: o sacramento do Matrimônio confere esta graça especial: conviver santamente e se amarem santamente, e, portanto, de se amarem sempre, assistirem-se mutuamente nas necessidades, sofrerem com paciência os defeitos um do outro. 

   4º - E de educarem cristãmente seus filhos: é esta uma outra graça especial deste sacramento. É a mãe especialmente quem primeiro, com o pai, deve encaminhar retamente uma criança, cultivando-lhe no espírito as boas qualidades e corrigindo-lhe as más. É esta uma missão muito grave e delicada; de a levar a cabo bem, está dependente o futuro da criança. Para este fim dá o sacramento aos pais as graças necessárias; mas quantos deixam, infelizmente, desaproveitada tal graça, e por isso não educam bem os próprios filhos!  

   O sacramento do Matrimônio dá também um aumento da graça santificante.   

EXEMPLO

   Henrique VIII, rei da Inglaterra, depois de ter publicado uma obra em defesa da doutrina católica contra Lutero e merecido do Papa o título de Defensor da Fé, concebeu uma paixão criminosa por Ana Bolena e, querendo desposá-la, pretendia que o Papa  declarasse nulo o matrimônio por ele contraído com Catarina de Aragão. O Papa, tendo verificado acuradamente e reconhecido válido o primeiro matrimônio, não pôde aderir ao desejo do rei, que ameaçou separar a Inglaterra da Igreja romana. Não obstante, o Papa, como era seu dever, foi inabalável, não concedeu o que não estava em seu poder conceder. O rei, obcecado pela paixão, repudiou a sua verdadeira esposa e intimou a separação de toda a nação da Igreja católica, perseguiu os que quiseram permanecer fiéis à Igreja romana, e matou muitos deles. A heresia anglicana e a separação da Inglaterra da Igreja tiveram origem na fidelidade do Papa ao seu dever: isto é, na recusa de dissolver um matrimônio verdadeiro e perfeito.