S. Lucas II, 33-40
"José e Maria, Mãe de Jesus, maravilhavam-se das coisas que se
diziam d'Ele. Simeão os abençoou e disse a Maria, sua mãe: Eis que este
(Menino) está posto para ruína e para ressurreição de muitos em Israel, e para
ser alvo de contradição. E uma espada trespassará a tua alma, afim de se
descobrirem os pensamentos escondidos nos corações de muitos. Havia também uma
profetisa, (chamada) Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser; estava em idade
muito avançada, tinha vivido sete anos com seu marido, desde a sua virgindade,
e (permanecido) viúva até aos oitenta e quatro anos. Não se afastava do templo,
servindo a Deus noite e dia com jejuns e orações. Ela também sobrevindo nesta
mesma ocasião, louvava a Deus, e falava dele a todos os de Jerusalém, que
esperavam a redenção. Depois que cumpriram tudo, segundo o que mandava a lei do
Senhor, voltaram para a Galileia, para a sua cidade de Nazaré. O Menino crescia
e se fortificava cheio de sabedoria, e a graça de Deus era com ele."
Caríssimos e amados irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo!
José e Maria
maravilhavam-se das coisas que se diziam de Jesus. Mas esta admiração não
datava deste dia somente. Maria, santíssima Mãe de Jesus, já havia
admirado a anunciação do Anjo, a
saudação de sua prima Isabel, a demonstração de alegria do Precursor nos seio
de sua mãe, os transportes de alegria de Zacarias no nascimento de seu filho
João. José e Maria juntos já haviam admirado a alegria dos Anjos, e seus santos
cânticos no nascimento do Salvador, a visita dos pastores, as adorações dos
Reis Magos e enfim maravilharam-se neste momento, a chegada inesperada do Velho
Simeão e o testemunho que acabava de dar do Cristo. Realmente quantos motivos
de admiração: "uma virgem concebe, uma mulher estéril dá à luz, um mudo
fala, Isabel profetiza, João salta de alegria no seio materno, os Magos adoram,
uma viúva O confessa, um justo espera" (Cf. Amb. L. II, in Luc.).
Simeão os abençoa:
É óbvio que não abençoa Jesus porque é o justo Simeão que desejava ser abençoado
por Ele. Abençoa, portanto, José e Maria. Embora Maria e José o ultrapassavam em santidade, Simeão possuía
a dignidade sacerdotal que lhe dava o direito de abençoar o povo.
Caríssimos, meditemos profundamente naquela profecia de
Simeão. Aqui este idoso justo se dirige só à Maria porque Maria somente era verdadeiramente a
mãe de Jesus, e José era apenas seu pai adotivo, portanto, pai só de nome.
Quando Simeão prediz que o Menino será ruína para muitos,
certamente já era a ponta da espada de dor a ferir o imaculado Coração de
Maria! Deus quer que todos os homens se salvem (Cf. 1 Tim., II, 4). O velho
Simeão, é obvio, não quis dizer que Jesus seria causa da ruína de muitos (seria
blasfêmia dizê-lo); queria sim dizer que seria ocasião. Antes já o havia
explicado o profeta Isaías: "E será
para vós um motivo de santificação, ao passo que servirá de pedra de tropeço, e
de pedra de escândalo às duas casas de Israel; de laço e de ruína aos
habitantes de Jerusalém" (Isaías VIII, 14 e 15). S. Paulo também o diz
em Romanos IX, 33: "Eis que eu ponho
em Sião uma pedra de tropeço; e uma pedra de escândalo; e todo aquele que crê
nela, não será confundido". O próprio Jesus explicá-lo-á: "Se eu não tivesse vindo e não lhes
tivesse falado, não teriam culpa, mas agora não têm desculpa de seu
pecado" (S. João XV, 22). Jesus Cristo é o único Salvador; mas muitos
O odiaram sem motivo. E rejeitar o Salvador é atrair para si a ruína.
Mas quando o Velho Simeão diz à Maria que Jesus foi
estabelecido para a ressurreição de muitos, ele quer dizer que Jesus é a causa,
e não somente a ocasião de sua salvação. Ele é a causa geral da salvação de
todos os homens, pelo benefício da Redenção; Ele é a causa particular da
salvação dos justos pela Sua graça. Ele nos abre a porta do céu pela sua Paixão
e Morte. Ele nos mostra o caminho pela Sua lei, Ele nos guia pelos seus
exemplos. Ele nos sustenta na graça pelos seus socorros. Nossa salvação vem
d'Ele, enquanto nossa condenação vem de nós: "A tua perdição, ó Israel, vem de ti mesmo, só em mim está o teu auxílio"
(Oseias XIII, 9).
Assim, Jesus Cristo foi a ressurreição de uns e a ruína de
outros entre os filhos de Israel. O que Ele foi para o tempo em que viveu e
para a nação que O possuiu, Ele não cessa de ser para as idades seguintes e
para a universalidade do gênero humano. Nosso Senhor Jesus Cristo é a
ressurreição de todos aqueles que escutam sua voz, que creem em sua palavra,
que observam sua lei e todos aqueles que confiam n'Ele como o único Mestre
divino. Por outro lado, Ele é ruína para aqueles que não querem ouvir sua doutrina,
que recusam crer n'Ele e rejeitam seus ensinamentos e desobedecem seus
preceitos.
O Velho Simeão acrescenta que Jesus será um
sinal de contradição. Esta profecia se realizou completamente na vida
de Jesus. Que espécie de contradição tenha lhe faltado? Contradição à Sua
pessoa, pois, não teve onde repousar a cabeça; contradição às Suas ações cujos
motivos foram deturpados; contradição em Seus milagres que foram atribuídos a
Belzebu; contradição às Suas palavras, que foram julgadas com intenções
pérfidas; contradição da parte dos fariseus que O caluniaram; da parte dos
doutores que O desprezaram; da parte dos sacerdotes que O perseguiram; da parte
do povo que, logo após querer aclamá-Lo rei, quis apedrejá-LO; mesmo da parte
dos Apóstolos cuja ignorância e ridículas pretensões Jesus se viu obrigado a suportar. E nestes
dois mil anos e hoje especialmente, Jesus é alvo de contradição, objeto de
ofensas pelas heresias e impiedades. Quantos Judas Iscariotes!... Quantos
hierarcas eclesiásticos negam a Jesus diante dos inimigos, muitos dos quais
estão inclusive infiltrados dentro da Igreja!
Pelos conhecimentos das profecias Messiânicas e agora
sobretudo pela profecia do Velho Simeão, Maria Santíssima contemplava o seu
Filho e tinha diante dos olhos aquela imagem que fora mostrada no céu, por uma
revelação divina, a S. João Evangelista: "Vi
um Cordeiro que estava de pé, parecendo ter sido imolado" (Cf. Apoc.
V, 6). O Cordeiro divino imolado pela salvação do mundo! E que dor para Maria saber que o Sangue deste Cordeiro
(que é o sangue de seu Coração Imaculado) será sem utilidade para muitos: "Quae utilitas in sanguine meo?"
E sua dor era naturalmente em proporção com seu amor. Ora, ela amava Jesus não
somente como seu Filho, mas também como seu Deus.
Mas estas dores de Maria, estes tormentos e esta morte de
Jesus teriam por efeito manifestar os corações de muitos. É
nestas circunstâncias, com efeito, que se revelarão e se descobrirão as
secretas disposições dos Judeus a respeito de Jesus; é, então, que aparecerão
seus verdadeiros discípulos e que se farão conhecer seus inimigos. A tentação
tem portanto esta utilidade de separar a palha do bom grão e os justos dos pecadores.
A perseguição faz aparecer os mártires e patenteia os apóstatas; a heresia e o
cisma colocam de um lado os filhos dóceis da Igreja e de outro, seus
adversários. As seduções do mundo arrastam os fracos no caminho do mal, mas
confirmam o fortes na senda do bem. As lutas presentes, as quais assistimos
durante algum tempo, estes combates encarniçados do erro contra a verdade,
estes ataques violentos a Jesus Cristo, à Igreja, ao sacerdócio, aos dogmas
obrigam os indecisos a se pronunciarem. E ai deles se não o fizerem! Na
verdade, os maus tornam-se piores, mas os bons se tornam melhores. E grande
número de indiferentes saem do sono de sua tibieza e alguns chegam mesmo a ser
campeões da fé.
E havia também uma profetiza chamada Ana etc.: Caríssimos, grande
número de pessoas habitavam o Templo, muito mais ilustres e mais elevados em
dignidade que Simeão e Ana: sacerdotes, escribas, doutores. Jesus não se manifesta
a eles. O Evangelho nos faz entender que foram as virtudes de Ana que lhe
atraíram esta grande dita: sua vida de oração, penitência e pureza. Sobretudo
esta última: "Bem-aventurados os
puros de coração, porque verão a Deus" (S. Mat. V, 8).
Caríssimos e amados irmãos, devemos crescer sem cessar,
progredir sempre na piedade, na virtude e na graça de Deus. É o preceito que
nos dá o primeiro Chefe visível da Igreja: "Crescei em graça e no conhecimento de
Nosso Senhor Jesus Cristo" (2 Pedro III, 18). Amém!
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