"Verdadeiramente ele foi o que tomou sobre si as nossas fraquezas,
ele mesmo carregou com as nossas dores; nós o reputamos como um leproso, como
um homem ferido por Deus e humilhado. Mas foi ferido por causa das nossas
iniquidades, foi despedaçado por causa de nossos crimes; o castigo que nos
devia trazer a paz, caiu sobre ele, e nós fomos sarados com as suas chagas... e
o Senhor carregou sobre ele a iniquidade de todos nós" (Isaías 53,
4-6).
De todas as meditações que possamos fazer, esta é, sem
sombra de dúvida, a que maior bem pode fazer às nossas almas!
A Paixão de Jesus Cristo marca o ponto culminante da obra
que vem realizar neste mundo, obra esta para qual todas as outras convergem ou
da qual tiram seu valor e eficácia. Para Nosso Senhor Jesus Cristo é a hora em
que consuma o sacrifício que deve dar ao Pai glória infinita, redimir a
humanidade e reabrir aos homens as fontes da vida eterna. Jesus chama "a
sua hora"! "Devo ser batizado
com um batismo - o batismo de sangue - e
quão grande é a minha ansiedade até que ele se conclua!" (S. Lucas
XII, 50). E quando chega esta hora, Jesus entrega-se com o maior ardor, apesar
de conhecer de antemão todos os sofrimentos que devem despedaçar-Lhe o corpo e
a alma: "Desejei com o maior ardor
comer esta Páscoa convosco, antes de sofrer a minha Paixão" (S. Lucas
XXII, 15). Diz S. Paulo: "Cristo
amou a Igreja e por ela se entregou a si mesmo" (Efésios V, 25). A
Igreja aqui significa o reino daqueles que devem formar o Corpo Místico de
Jesus (cf. 1 Cor. XII, 27). Jesus amou esta Igreja, e foi por a ter amado que
se entregou por ela. Eis o que moveu Jesus a sofrer e morrer: o amor. Sem
dúvida, antes e acima de tudo, foi por amor ao Pai que Jesus Cristo quis sofrer
a morte na Cruz, como Ele mesmo diz expressamente: "Mas é preciso que o mundo conheça que eu amo o Pai e que faço
como Ele me ordenou. Levantai-vos, vamo-nos daqui" (S. João XIV, 31), e foi para o Horto das
Oliveiras (cf. S. João XVIII, 1). Mas é também o seu amor para conosco. Aliás
esta era a vontade do Pai, como disse a Pedro: "Não hei de beber o cálice que o Pai me deu?" (S. João
XVII, 11).
Na ultima Ceia, que diz aos Apóstolos, congregados em volta
d'Ele? "Não há maior amor do que dar
a vida pelos seus amigos" (S. João XV, 17). Demais, entregou-se à morte
livremente: "Oblatus est quia ipse
voluit" (Isaías 53, 7)= "Foi oferecido (em sacrifício) porque ele
mesmo quis". E, caríssimos, esta liberdade com que Jesus Cristo dá a
sua vida por nós, é absoluta. Meditemos: "Deus
amou o mundo a ponto de lhe dar o Seu Filho único", e Jesus Cristo,
por sua vez, amou os seus irmãos a ponto de se entregar a si mesmo total e
espontaneamente para os salvar. Sua alma e seu corpo, em verdade, são
dilacerados, esmagados pelos sofrimentos. Não há nenhum sofrimento que Jesus não
experimente. Já no Getsêmani dissera: "A minha alma está triste até a
morte!" Que abismo! Um Deus, Poder e Beatitude infinita, "acabrunhado
pela tristeza, pelo pavor e pelo tédio". O Verbo Encarnado conhecia todos
os sofrimentos que iam cair sobre Ele durante as longas horas de sua Paixão.
Esta visão fazia nascer na Sua natureza sensível toda a repulsa que teria
sentido uma simples criatura. Na Divindade a que estava unida a Sua alma via
claramente todos os pecados dos homens, todos os ultrajes feitos à santidade e
ao amor infinito de Deus. Via a inutilidade de Seu Sangue para muitos, para os
quais Jesus seria ruína, como predissera o Velho Simeão. Tomou sobre si todas
estas iniquidades e sentia pesar sobre sua cabeça toda a Justiça divina. Mas
Jesus tudo aceita. Sai do Jardim e vai ao encontro dos seus inimigos. Traído
pelo beijo de um dos Seus apóstolos, acorrentado pela soldadesca como um
malfeitor, é levado ao Sumo Sacerdote. Ali cala-se no meio das falsas
acusações. Fala apenas para proclamara que é o Filho de Deus. Jesus, Rei dos
mártires, morre por haver confessado a Sua divindade, e todos os mártires darão
a vida pela mesma causa.
Pedro, Chefe dos Apóstolos, por três vezes renegou a Jesus.
Foi esse, sem dúvida, para o nosso divino Salvador um dos mais profundos
sofrimentos daquela terrível noite.
Os soldados guardam Jesus e cobrem-No de injúrias e maus
tratos. Vendam-Lhe os olhos e dão-Lhe bofetadas. Homens perversos, mancham com
nojentos escarros aquela face adorável que arrebata os Anjos!
Logo de manhã foi conduzido ao Sumo Sacerdote, depois
arrastado de tribunal a tribunal; tratado por Herodes como louco e insensato,
Ele, a Sabedoria eterna; açoitado por ordem de Pilatos; os algozes ferem sem dó
a vítima inocente, cujo corpo se torna logo uma chaga viva. Enterram na cabeça
de Jesus uma coroa de espinhos, e cobrem-No de escárnios.
O covarde governador romano imagina que o ódio dos judeus
ficará satisfeito vendo Jesus Cristo naquele triste estado; apresenta-O à
multidão: "Ecce homo", Eis aqui o homem! Contemplemos neste momento o
divino Mestre mergulhado nesse abismo de sofrimentos e humilhações, e pensemos
que o Eterno Pai também no-Lo apresenta, dizendo: "Eis aqui o meu Filho, o
esplendor da minha glória, ferido por causa dos crimes do meu povo: "Eu o feri por causa dos crimes do meu
povo" (Isaías 53, 8).
Jesus ouve os gritos daquela populaça enfurecida que Lhe
prefere um bandido e em paga de todos os benefícios que d'Ele recebeu, reclama
a Sua morte: "Crucifica-o, crucifica-o!" É, pois, pronunciada a
sentença de morte; e Jesus Cristo tomando em seus ombros feridos a pesada cruz,
dirige-se para o Calvário. À vista de Sua Mãe tão ternamente amada e cuja
dolorosa aflição compreende melhor do que ninguém! A aflita Mãe vê quando o
despojam das suas vestes, sente em seu Imaculado Coração o eco sinistro das
cruéis marteladas que prendem-no na Cruz com pontiagudos cravos. Como Maria
Santíssima deve ter sentido quando ouve Seu Filho dizer: "Tenho
sede!" e não poder mitigá-la. Ouve os odiosos sarcasmos dos seus piores
inimigos. Enfim, o abandono por parte do Pai Eterno: "Pai, por que me abandonaste?".
Jesus bebeu o cálice da amarguras até a última gota;
realizou tudo o que fora predito: "Consummatum
est" , sim tudo está consumado, só Lhe resta entregar a alma ao Pai: "E inclinando a cabeça, entregou o
espírito" (S. João XIX, 30).
Ajoelhemo-nos e cada um diga do fundo da alma: "Ó
Divino Salvador que tanto sofrestes por amor de nós, prometo-Vos fazer o
possível por não mais pecar. Fazei pela Vossa graça, ó Mestre adorável, fazei
com que morramos para tudo quanto é pecado, apego do pecado ou à criatura, e
que só vivamos para Vós!" "O AMOR DE QUE JESUS CRISTO NOS DEU PROVA
MORRENDO POR NÓS DEVE FAZER COM QUE AQUELES QUE VIVEM JÁ NÃO VIVAM PARA SI, MAS
PARA AQULE QUE MORREU POR ELES" (2 Cor. V, 15).
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