"E não digas: A misericórdia do Senhor é grande, ele se
compadecerá da multidão dos meus pecados. Porque a sua misericórdia e a sua justiça
estão perto uma da outra, e ele olha para os pecadores na sua ira" (Eclesiástico
V, 6 e 7).
Não podemos duvidar que a misericórdia divina é infinita.
Devemos igualmente estar convencidos pelo próprio Espírito Santo que Deus é
justo. Não podemos entender "misericórdia", como se fosse sinônimo de IMPUNIDADE. Não se
admite isso nem em se tratando da Justiça Humana, quanto mais da Divina! Assim,
ao terminar a parábola da dracma perdida, parábola esta que o Divino Salvador
fez para mostrar a Misericórdia de Deus, conclui com estas palavras:
"Haverá alegria no céu entre os anjos de Deus por um só pecador que faça
penitência". Se não podemos deixar de ver aí a misericórdia divina, também
não podemos fechar os olhos para a condição indispensável para que ela se
efetue: "QUE FAÇA PENITÊNCIA". Seria até blasfêmia ou, pelo menos,
chegaria às raias dela, dizer que Deus, em sua misericórdia perdoa sempre, com
arrependimento ou sem ele, com conversão de vida ou sem ela.
São Paulo afirma categoricamente falando aos romanos; e,
dados os escândalos oficiais das nações, é bom citarmos todo o contexto: "Pelo que Deus os abandonou aos desejos do seu coração, à
imundície; de modo que desonraram os seus corpos em si mesmos, eles que
trocaram a verdade de Deus pela mentira e que adoraram e serviram a criatura de
preferência ao Criador, que é bendito por todos os séculos. Amém. Por isso Deus
entregou-os a paixões de ignomínia. Efetivamente, as suas próprias mulheres
mudaram o uso natural em outro uso, que é contra a natureza, e, do mesmo modo,
também os homens, deixando o uso natural da mulher, arderam nos seus desejos
mutuamente, cometendo homens com homens a torpeza e recebendo em si mesmos a
paga que era devida ao seu desregramento. Como não procuraram conhecer a Deus,
Deus abandonou-os a um sentimento depravado, para que fizessem o que não convém,
cheios de toda a iniquidade, de malícia, de fornicação, de avareza, de maldade,
cheios de inveja, de homicídios, de contendas, de engano, de malignidade,
mexeriqueiros, detratores, odiados por Deus, injuriadores, soberbos, altivos,
inventores de maldades, desobedientes aos pais, insensatos, sem lealdade, sem
afeto, sem lei, sem misericórdia. Os quais, tendo conhecido a justiça de Deus,
não compreenderam que os que fazem tais coisas são dignos de morte; e não
somente quem as faz, mas também quem aprova aqueles que as fazem"
(Rom. I, 24- 32). E logo no capítulo II, 4-9: "Ou desprezaste as riquezas da sua bondade e paciência e
longanimidade: Ignoras que a bondade de Deus te convida à penitência? Mas com a
tua dureza e coração impenitente acumulas para ti um tesouro de ira no dia da
ira e da manifestação do justo juízo de Deus, que há de dar a cada um segundo
as suas obras: a vida eterna aos que, perseverando na prática do bem, buscam a
glória, a honra e a imortalidade; ira e indignação aos que são pertinazes, não dóceis à verdade, mas dóceis à injustiça".
Diz Santo Agostinho que o demônio seduz os homens por duas
maneiras: "Com desespero e com esperança. Depois que o pecador cometeu o
delito, arrasta-o ao desespero pelo temor da justiça divina; mas, antes de
pecar, excita-o a cair em tentação pela esperança na divina misericórdia".
E o adverte: "Depois do pecado tenha esperança na divina misericórdia;
antes do pecado tema a justiça divina". Caríssimos, na verdade não merece
a misericórdia de Deus aquele que ser serve da mesma para ofendê-Lo. Daí dizer
Santo Afonso: "A misericórdia é para quem teme a Deus e não para o que dela
se serve com o propósito de não temê-Lo". Diz ainda um autor: "Aquele
que ofende a justiça, pode recorrer à misericórdia; mas a quem pode recorrer o
que ofende a própria misericórdia?" Santa Brígida dizia que os pecadores
só pensam na misericórdia. São Basílio também dizia o mesmo: "Os pecadores
só querem considerar a metade: o Senhor é bom; mas também é justo. Não
queiramos, continua o santo, considerar unicamente uma das faces de Deus".
"Tolerar quem se serve da bondade de Deus para mais O ofender, fora antes
injustiça que misericórdia", diz também S. João d'Ávila. Maria Santíssima
disse: "Et misericordia ejus timentibus eum" (São Lucas, I, 50). "Acautelai-vos - diz
S. João Crisóstomo - quando o demônio (não Deus) vos promete a
misericórdia divina com o fim de que pequeis" (Hom. 50, ad populum
Antiochenum). "Quem ofende a Deus, fiado na esperança de ser perdoado, é
um escarnecedor e não um penitente", diz Santo Agostinho. São Paulo afirma: "De Deus não se pode zombar"
(Gál. VI, 7). Mas seria zombar de Deus o querer ofendê-Lo sempre que
quiséssemos e desejar, a seguir, o paraíso. Quem semeia pecados, não pode
esperar outra coisa que o eterno castigo no inferno. "Em realidade, aquilo que o homem semear, isso também colherá.
Aquele que semeia na sua carne, da carne colherá corrupção; mas o que semeia no
Espírito, colhera do Espírito a vida eterna" (Gálatas VI, 7-9).
O rei Manassés pecou; converteu-se em seguida, e Deus lhe
perdoou. Mas para Amon, seu filho, que, vendo quão misericordiosamente seu pai
havia conseguido o perdão, entregou-se à má vida com a esperança de também ser
perdoado, mas para ele não houve misericórdia. Deus, na verdade vai à procura
do pecador com toda solicitude; espera com toda paciência a sua conversão; se o
pecador se converte, perdoa-o com toda misericórdia a tal ponto que nem se lembra
mais das suas ofensas, e há alegria até
entre os anjos. Se o pecador, porém, não
se converte e até abusa desta paciência e misericórdia divinas, então, além de não
ser perdoado, seus castigos serão maiores, porque desprezou a justiça e abusou
da misericórdia.
Deus tem paciência e espera; mas, se o pecador não
aproveitá-las para se converter e fazer penitência, chega afinal a hora da
justiça e então, Deus não espera mais e castiga. Diz Santo Afonso de Ligório:
"Deus aguarda o pecador a fim de que se emende (Isaías, XIX, 18); mas,
quando vê que o tempo concedido para os pecados só serve para multiplicá-los,
vale-se desse mesmo tempo para empregar a justiça" (Lam. I, 15). Deus, ou
envia a morte ao pecador, ou o priva das graças abundantes (que sempre concede
aos que aproveitam de sua misericórdia) e só lhe deixa a graça suficiente com
que o pecador se poderia salvar, mas não se salva, porque estas graças DE SI
SUFICIENTES, tornam-se, por culpa do pecador, INEFICAZES. Quando um pecador chega
a perder o temor de Deus, não sente mais remorsos, seu coração já está empedernido,
sua consciência já está cauterizada, aí só há trevas em sua alma e despreza a
graça de Deus e só ama o que deveria odiar. Entrega-se inteiramente às suas
paixões e assim morre. Muitas vezes, Deus nem os castiga neste mundo, porque
esta vida de pecados é o seu maior castigo. Pode haver coisa mais terrível para
um doente do que quando o médico diz (com sorriso forçado): não é caso de
cirurgia, não precisa fazer mais dieta, nem precisa tomar mais remédio, pode ir
para casa. É tão terrível que o médico não diz o motivo para o paciente. Mas
chama os parentes e diz: infelizmente não há mais nada a fazer, é um câncer em
fase terminal.
Se aquela figueira, encontrada estéril por seu dono, não
desse fruto depois do ano concedido como prazo para cultivá-la, quem ousaria
esperar que se lhe desse mais tempo e não fosse cortada. Santo Agostinho
comenta: "Ó árvore infrutuosa! O golpe de derrubada não foi desferido mas
diferido. Mas não creias mais segura, porque serás cortada! A pena foi adiada
mas não suprimida. Se tornares a abusar da misericórdia divina, o castigo te
atingirá: serás cortado. Esperas, portanto, que o próprio Deus te envie ao
inferno? Mas, se te envia, já o sabes, jamais haverá remédio para ti. O Senhor
se cala, mas não para sempre. Quando chega a hora da justiça, quebra o
silêncio. "Isto fizeste, eu
calei-me. Pensaste iniquamente que eu seria como tu; arguir-te-ei e porei
(tudo) diante de teu rosto" (Salmo 49, 21).
Pelos merecimentos de vossa morte, ó caríssimo Redentor,
concedei-me amor tão fervoroso que convosco me una estreitamente e jamais possa
desprender-me de Vós. Ajudai-me, ó Virgem Maria, por vossa intercessão;
alcançai-me a santa perseverança e ao amor para com Cristo Jesus. Amém!
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