S. Lucas XV, 1-10
Haverá mais júbilo no céu por um
pecador que fizer penitência.
Caríssimos e amados irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo!
"Aproximaram-se
de Jesus os publicanos e os pecadores paro o ouvir. Os fariseus e os escribas
murmuravam, dizendo: Este recebe os pecadores e come com eles. Jesus,
propôs-lhes, então esta parábola": a parábola da ovelha tresmalhada, a
parábola da dracma perdida (como narra o evangelho seg. S. Luc. XXV, 1-10); em
seguida Jesus propõe-lhes ainda a parábola do filho pródigo. Três parábolas
para mostrar a misericórdia divina e como ela se exerce. Delas consta todo o
capítulo XV de S. Lucas.
Caríssimos, era mui natural que os publicanos e os pecadores
se aproximassem de Jesus para O ouvir. Pois, anunciava uma tão bela doutrina!
Jesus pregava uma tão santa moral! Por ser pecadores, estes homens não deixavam
de ser também sensíveis ao verdadeiro, ao justo e ao belo. Na verdade, esta
doutrina era elevada e sublime; esta moral era grave e austera. Mas a doçura de
Jesus, sua bondade, sua afabilidade temperavam tão bem o que sua doutrina e sua
moral pudessem oferecer de severo! Os pecadores sabiam que Jesus era um médico
que veio para curar nossas doenças, e eles não se iludiam sobre o lamentável
estado de suas almas e sentiam que eram doentes; e justamente por isso vinham a
Jesus do qual esperavam a sua cura. "E assim, diz Santo Ambrósio, toda
alma deve aproximar-se de Jesus Cristo, porque Ele é tudo para nós. Tendes uma
ferida a cicatrizar? Ele é remédio. Estais presos ao fogo da febre? Ele é uma
fonte refrescante. Estais curvados sob o peso da iniquidade? Ele é a justiça.
Tendes necessidade de socorro? Ele é a força. Temeis a morte? Ele é a Vida.
Desejais o céu? Ele é o caminho que para lá conduz. Fugis das trevas? Ele é a
Luz. Procurais alimento? Ele é um alimento" (Lib., III, de Virginibus).
Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores e Ele espera-os
com paciência, procura-os com solicitude e recebe-os com alegria quando
arrependidos se voltam para Ele. É justamente para justificar esta Sua conduta
que Nosso Senhor Jesus Cristo propõe aos orgulhosos fariseus e escribas as três
parábolas da misericórdia. Com a graça de Deus, meditemos um pouco sobre a
primeira.
"Qual de vós,
tendo cem ovelhas, se perde uma delas, não deixa as noventa e nove no deserto,
e vai procurar a que se tinha perdido, até que a encontre? E, tendo-a
encontrado, a põe sobre os ombros todo contente; e, indo para casa, chama os
seus amigos e vizinhos, dizendo;lhes: Congratulai-vos comigo, porque encontrei
a minha ovelha, que se tinha perdido". A ovelha é um animal simples e
tímido, que, procurando sua pastagem, afasta-se facilmente do caminho que ela deve
seguir e do rebanho ao qual ela deve permanecer unida; e quando se perde é
incapaz de reencontrar o seu caminho. É preciso, portanto, que o pastor a ajude
e procure-a com cuidado. É bem a nossa imagem. "Todos nós andamos desgarrados como ovelhas errantes; cada um se
extraviou por seu caminho" (Isaías LIII, 6). Correndo após o pecado, e
levados pelo atrativo da concupiscência, nós caímos nos abismos do mal, e não
pensamos mais nem em Deus, nem na salvação, nem no céu. Eis porque Jesus Cristo
desceu do Céu. Deixou lá no alto as noventa e nove ovelhas fiéis, isto é, os
anjos, para vir aqui em baixo, e correr em socorro da humanidade representada
pela ovelha infiel.
"E quando a
encontra, coloca-a sobre seus ombros todo contente". Fatigado o bom
Pastor, por suas caminhadas à procura da ovelha errante; tinge as estradas com
seu sangue; deixa pedaços de sua carne nos espinheiros da estrada. Ele é que
teria necessidade de ser levado depois dos trabalhos penosos que Lhe custaram a
procura de sua ovelha. Mas não, Ele não se importa consigo, só pensa na sua
ovelha que a põe aos ombros, embora ela se tenha transviado por culpa própria.
Ela merecia ser punida, e o pastor indignado teria todo direito de a castigar
com seu bastão, fazendo-a caminhar à sua frente. Mas, ao contrário, o bom
Pastor além de não a repreender, toma-a amorosamente em seus braços e coloca-a
aos ombros, sobre seu pescoço, e leva-a até ao redil, isto é, da terra ao céu.
Esta imagem da bondade de Jesus tocou de tal modo os cristãos dos primeiros séculos,
que eles não deixaram de O representar sob este tocante símbolo, um pastor
levando sua ovelha; encontra-se este símbolo entre as pinturas que ornam ainda
as paredes das catacumbas de Roma.
"E Indo para casa
, chama os seus amigos e vizinhos, dizendo-lhes: Congratulai-vos comigo, porque
encontrei a minha ovelha, que se tinha perdido". Caríssimos, observai
bem esta linguagem: congratulai-vos
COMIGO, e não: congratulai-vos com a OVELHA. Explica são Gregório: "A
nossa vida, faz Sua alegria. Esta alegria é tão grande que não a pode conter
dentro de si. É mister que ela se manifeste para fora, é preciso que ela se
expanda, é necessário que dela tome parte os seus amigos, os anjos, que gozam
continuamente com sua vista e são mais vizinhos d'Ele que todas as outras
criaturas".
"Digo-vos que do
mesmo modo, haverá mais júbilo no céu por um pecador que fizer penitência, que
por noventa e nove justos que não têm necessidade de penitência". Portanto,
lá no alto do céu, os anjos se interessam por nós. Eles se alegram com a
conversão dos pecadores. E Deus se compraz em lhes notificá-la como um bem que
lhes toca de perto. Na verdade, os anjos são amigos dos homens. Eles vêem em
nós, amigos, criaturas de Deus como eles, espíritos inteligentes como eles,
embora mesclados aos corpos; eles sabem que nós somos chamados a participar um
dia de sua glória, a ocupar os tronos que a deserção dos anjos rebeldes deixou
vacantes. É normal que eles fiquem felizes com o nosso retorno ao bem, com a
nossa conversão. De um lado, amam a Deus
e desejam vivamente sua glória e congratulam-se com tudo aquilo que a
pode procurar. E a conversão de um pecador é uma vitória alcançada por Deus
sobre o mal, é uma alma arrancada às garras do demônio, é um cativo preso ao
carro de Jesus que o conduz ao céu.
A conversão dum pecador, é portanto o objeto duma grande
alegria por parte dos anjos, alegria esta muito maior do que aquela sentida por
eles por causa da perseverança de noventa e nove justos; não obviamente porque
a perseverança de noventa e nove justos não seja em si mesma um bem muito maior
do que a conversão de um só pecador; mas o retorno de um pecador é um bem novo,
e por conseguinte mais sensível, mais
comovente que aquele que se tem o costume de gozar por muito tempo, e
cuja doçura é por isto mesmo um pouco enfraquecida. A conversão de um pecador é
de alguma maneira um novo elemento acrescido à felicidade já tão grande dos
anjos.
Como esta meditação deve alentar os pecadores a se
converterem e os pastores a se dedicarem inteiramente, bondosamente,
incansavelmente à conversão dos pecadores e hereges.
Jesus termina a parábola da dracma perdida com o mesmo
ensinamento moral com que terminou a da ovelha tresmalhada. Esta repetição e
esta insistência indicam bem a verdade, a sinceridade, a vivacidade da alegria
causada aos anjos e a Deus mesmo pela conversão dos pecadores.
Eis alguns lições destas reflexões que acabamos de fazer: 1-
Deus não rejeita "a priori" os pecadores, mas os chama a Ele, os
instrui, Ele se esforça para os tocar com a sua graça e os reconduzir à
virtude, ao bem: "Não vim chamar os
justos, mas os pecadores à penitência". 2- Se estas parábolas nos
ensinam a misericórdia de Deus, outrossim nos faz ver claramente como e quando
ela é exercida. "HAVERÁ MAIS JÚBILO NO CÉU POR UM PECADOR QUE FAZ
PENITÊNCIA". Os Fariseus no
tempo de Jesus e os Jansenistas em nossos tempos, não pensam em misericórdia
para os pecadores. Só pensam em JUSTIÇA. Por outro lado, os progressistas em
nossos dias, só pensam em misericórdia e esta de tal modo deturpada que vem a
ser antes impunidade e parece que para eles não há Justiça. Querem acolher e
abraçar os pecadores e hereges sem conversão, sem mudança de vida, ou seja, sem
penitência. A "misericórdia dos progressistas" não visa tirar o pecado
mas tranquilizar o pecador no mesmo. Devemos fazer como o Divino Mestre,
procurar a conversão dos pecadores com um zelo cheio de bondade e mansidão; mas
acolher com alegria, e admitir à mesa eucarística apenas os que realmente se
convertem e fazem penitência. A parábola do filho pródigo que Jesus contou logo
em seguida a estas duas, mostra bem isto. Amém!
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