O JUÍZO UNIVERSAL
"Tendo
dito isto,(Jesus) elevou-se à vista deles; e uma nuvem os ocultou aos seus
olhos. Como estivessem olhando para o céu, quando ele ia subindo, eis que se
apresentaram junto deles dois personagens vestidos de branco, os quais lhes disseram:
Homens da Galileia, por que estais olhando para o céu? Esse Jesus que,
separando-se de vós, foi arrebatado ao céu, virá do mesmo modo que o vistes ir
para o céu" (Atos I, 9-11).
"Pois é necessário que todos nós compareçamos diante do tribunal
de Cristo, para que cada um receba o que é devido ao corpo, segundo fez o bem
ou o mal" (2 Cor. V, 10).
Vamos seguir o Catecismo Romano.
SUA REALIDADE: Em prova do Juízo Final, basta citar esta passagem
do Apóstolo: "Todos nós teremos de comparecer perante o tribunal de
Cristo, para que cada um receba retribuição do bem ou do mal, que tiver
praticado em sua vida terrena" (2 Cor. V, 10 e Rom. XIV, 10).
A Escritura está cheia de textos, que os párocos descobrirão
a cada passo, quando quiserem explicar este mistério e torná-lo mais acessível
à inteligência dos fiéis (P. ex.: 1 Reis, 2, 10; Oséias 95, 13; Is 2, 12; Jer. 46, 10; Dan. 7, 26;
Joel 2, 1-13; Sof. 1, 7-14; Mal. 4, 1; Mat. 13, 40; Luc. 17, 24; Atos 1, 11;
Rom. 2, 16; 1 Cor. 15, 51; 1 Tess. 1, 10; Apoc. 20, 11).
O Juízo final é
objeto de nossa esperança: Se desde o início do mundo, todos ansiavam pelo
dia em que o Senhor Se revestiu de nossa carne, porquanto neste mistério punham
a esperança de seu resgate, também agora devemos -
depois da Morte e Ascensão do filho de Deus - suspirar ardentemente pelo segundo Dia do
Senhor, "aguardando a ditosa esperança e o aparecimento da glória do
grande Deus" (Tito II, 13).
Explicação dos dois
juízos: Na explicação desta matéria, os párocos terão de atender às duas
ocasiões em que todo homem deve comparecer na presença do Senhor, para dar
contas de todos os seus pensamentos, ações e palavras, e aceitar finalmente a
sentença imediata do juiz. (Cf. Hebr. IX, 27).
O juízo particular: A
primeira ocasião é o momento em que cada um de nós deixa este mundo; é levado
incontinente ao tribunal de Deus, onde se examina, com a máxima justeza, tudo o
que jamais fez, disse, e pensou em sua vida. [No original em latim: "Ibique
de omnibus justissima quaestio habebitur, quaecumque aut egerit homo, aut
dixerit, aut cogitaverit unquam". Tomo a liberdade de corrigir a tradução
porque em latim "unquam" só significa "jamais" nas frases
negativas, interrogativas e condicionais. Nos outros casos significa: em algum momento, em algum dia. Então a
tradução correta: "Onde se examina com a máxima justeza, tudo o que em
algum momento o homem fez, disse e pensou em sua vida"]. É o que se
chama Juízo Particular.
O juízo universal: A
segunda ocasião, porém, há de ser quando todos os homens comparecerem juntos,
no mesmo dia e lugar, perante o tribunal do juiz, para que, na presença de
todos os homens de todos os séculos, cada um venha a saber a sentença que a seu
respeito foi lavrada. Para os ímpios e malvados, esta declaração de sentença
constituirá a não menor parte de suas penas e castigos; ao passo que os
virtuosos e justos nela terão boa parte de sua alegria e galardão. Naquele
instante, será pois revelado o que foi cada indivíduo, durante sua vida mortal.
Este Juízo se chama Universal.
Motivos para o Juízo
Universal:
a) Abrir todas as
consciências. Será então necessário
mostrar porque, além do Juízo Particular para cada um, se fará ainda outro
geral para todos os homens. Ora, os mortos deixam às vezes filhos que imitam os
pais; descendentes e discípulos que seguem e propagam seus exemplos em palavras
e obras. Esta circunstância aumenta necessariamente os prêmios ou castigos dos
próprios mortos (Basilius M. de vera virginitate). [A primeira vista isto
parecer-nos-á estranho; por isso, abaixo no final, explicá-lo-ei]. Tal
influência, cujo caráter benéfico ou maléfico empolga muitos, só acabará no
último dia do mundo. Convinha, então, fazer-se uma perfeita averiguação de
todas essas obras e palavras, quer sejam boas, quer sejam más. O que, porém, não
seria possível sem um julgamento geral de todos os homens.
b) Reabilitar os
justos. Outro motivo ainda. Muitas vezes, os justos são lesados na
reputação, enquanto os ímpios passam por grandes virtuosos. Pede a divina
justiça que, numa convocação para o público julgamento de todos os homens,
possam os justos recuperar a boa fama, que lhes fora iniquamente roubada aos
olhos do mundo.
c) Responsabilizar
também o corpo. Além disso, em tudo o que façam durante a vida, bons e maus
não prescindem da cooperação de seus corpos. Daí decorre, necessariamente, que
as boas ou más ações devem atribuir-se também aos corpos, que delas foram
instrumentos. Era, pois, de suma conveniência que os corpos partilhassem, com
as almas, dos prêmios da eterna glória ou dos suplícios, conforme houvessem
merecido. Isto, porém, não poderia efetuar-se, sem a ressurreição de todos os
homens, e sem um julgamento universal.
d) Justificar a
Providência de Deus. Como também a fortuna e a desgraça não fazem escolha
entre bons e maus, era afinal necessário provar que tudo é dirigido e governado
pela infinita sabedoria e justiça de Deus. Convinha, pois, não só reservar, na
vida futura, prêmios aos bons e castigos aos maus, mas também decretá-los num
juízo público e universal, que os tornasse mais claros e evidentes a todos os
homens. Desta forma, todos renderão louvor a Deus pela sua justiça e
providência, em desagravo daquela injusta queixa com que às vezes nos próprios
Santos, por sentimento humano, se lastimavam, ao verem os maus na posse de grandes
cabedais e dignidades. O Profeta (Davi) dizia: "Meus pés estiveram a ponto
de vacilar. Por pouco se não transviaram meus passos, porque me enchi de zelo
contra os maus, quando observava a vida bonançosa dos pecadores" (Salmo
72, 2 e 3). Mais adiante: "Eis que, sendo pecadores, e favorecidos pelo
mundo, eles conseguiram riquezas. E eu disse: Então não me adiantou guardar
puro meu coração, e lavar em inocência minhas mãos; em ser torturado o dia
inteiro, e padecer aflição desde o romper da madrugada" (Salmo 72, 12-14).
Por conseguinte, precisava haver um Juízo Universal, a fim de que os homens se
não pusessem a comentar que Deus passeia pelos quadrantes do céu, e que pouco
se Lhe dá a sorte das coisas terrenas (Cf. Jó 22, 14). Com toda razão foi
incluída a fórmula desta verdade nos doze artigos do Credo, para apoiar, com a
força da doutrina, os ânimos que duvidem da providência e justiça de Deus.
e) Alentar os bons e
aterrar os maus. Sobretudo, era mister que a lembrança do Juízo alentasse
os bons, e aterrasse os maus. Conhecendo a justiça de Deus, aqueles não viriam
a desfalecer; estes seriam arredados do mal, graças ao temor e à expectação dos
eternos castigos. Por isso, falando do Último Dia, Nosso Senhor e Salvador
declarou que haveria um Juízo Universal. Descreveu os sinais do tempo em que há
de chegar, para que, ao vê-los, reconhecêssemos estar perto o fim do mundo.
Depois, no momento de subir aos céus, enviou Anjos que dissessem aos Apóstolos,
tristes com Sua ausência, as seguintes palavras de consolação: "Este Jesus
que de vosso meio foi arrebatado ao céu, há de vir assim como O vistes subir ao
céu" (Atos I, 11).
Observação: O Catecismo Romano continua tratando do Juízo
Universal; mas, para não me alongar por demais, e ao mesmo tempo, querendo desde
já explicar o primeiro motivo do Juízo Universal aduzido pelo Catecismo Romano,
omitirei o restante deste capitulo.
Que Deus me ajude a bem explicar o primeiro motivo do Juízo
Universal acima aduzido pelo Catecismo Romano: Abrir todas as consciências. Em primeiro lugar citarei alguns
escritores célebres a começar pelos santos que escreveram sobre isto. Santo
Antônio Maria Claret, a primeira e mais lídima glória do Concilio Vaticano I,
Missionário extraordinário e fundador dos Missionários do Coração de Maria,
assim diz em seu Catecismo da Doutrina Cristã: "Os bons e os maus, com as
obras que fizeram e com o bem que omitiram, deixaram neste mundo uma herdade
plantada que, no bem ou no mal, continua a frutificar aumentando o prêmio ou o
castigo; no dia do juízo (está falando sobre o Juízo Universal), porém chegará
o seu fim, pois, então se verá todo o bem que fizeram os justos e todo o mal
dos malvados". E hoje pensamos na aplicação destas palavras ao próprio
Santo Antônio M. Claret que deixou escritos 144 livros, queimou 3 mil livros
obscenos e estampas escandalosas e distribuiu gratuitamente só na Ilha de Cuba
mais de 200 mil livros bons. Olhando o outro lado da moeda, Fidel Castro no dia
do Juízo Final dará contas a Deus pelos males do Comunismo que perdurarem mesmo
após a sua morte.
Ouçamos agora o célebre escritor Dom Plat: "Todo homem
há de pagar tributo à morte. E desde aquele momento seus atos bons cessam de
merecer, e os maus cessam de atrair novos castigos? Não, porque, ainda que o
homem em questão, não mereça nem desmereça em virtude de atos pessoais, estes
atos, realizados durante sua vida mortal, continuam tendo consequências boas,
se foram louváveis, e consequências funestas, se foram maus ou criminosos. O
Doutor Angélico, em seu magistral artigo sobre este tema (S. Thel. 3ª Parte, q.
59, a. 5. Este será o artigo do próximo sábado) põe a Ario como exemplo: Ario que foi o
primeiro dos grandes heresiarcas, Ario, o precursor, o inspirador, o pai, mais
ou menos direto, da maior parte das heresias que hão desolado e que
provavelmente desolarão o Oriente até a consumação dos séculos: "Ex deceptione Arri, et aliorum
fautorum pullulat infidelitas usque ad finem mundi" (...) Passemos
agora, continua Plat, a outra classe de coisas mui diferentes: Que bem não fez
S. Vicente de Paulo durante os oitenta anos de sua existência mortal (...) e é
mui provável que esta influência do santo se perpetuará até o fim dos séculos.
O que equivale dizer que (...) o santo varão aumentará de dia em dia o número
de seus méritos. (...) Oh! quão grande é
a responsabilidade que contraímos por nossas ações! Para muitos esta
responsabilidade será tal, que a conta da mesma não se encerrará até a
consumação dos séculos. Por esta razão , podemos dizer com um autor espiritual
(Gaussens): "É necessário o juízo final, para que todas nossas boas obras
hajam dado seu fruto; é necessário o juízo final, para que, ao findar o tempo,
havendo manifestado todas as consequências de nossa vida, o justo Juiz possa
examinar, em toda sua extensão, nossa culpabilidade ou nosso mérito" (Cf.
Expl. do Cat. de S, Pio V, Símbolo dos Apóstolos, sermão 50º).
Agora, o Catecismo Católico Popular por Francisco Spirago:
"No Juízo (Final) Deus revelará também a sua JUSTIÇA, porque acabará o que
ficou imperfeito no juízo particular. Os atos, as palavras, os escritos de
muitos homens fizeram ainda bem e mal depois da morte deles; os apóstolos, os
missionários encheram de benefícios numerosas gerações; assim também os hereges
corromperam não só os contemporâneos, mas também a posteridade. O grão semeado
pelo homem não chega à completa maturidade senão no Juízo Final".
Mas a mente humana exige ainda uma ulterior explicação:
porque é de todos sabido que, após a morte não se pode mais nem merecer nem
desmerecer. A parábola das dez minas(moedas de ouro) parece lançar uma luz
sobre este assunto, à primeira vista, obscuro (S. Lucas XIX, 11-27). O homem
nobre voltando depois de ter tomado posse de seu reino, chamou os dez servos
para que prestassem contas e como o que recebera 1 moeda não a fez frutificar, disse-lhe o Rei:
"... Por que não puseste o meu dinheiro num banco, para que, quando eu
viesse, o recebesse com os juros? E disse aos que estavam presentes: Tirai-lhe
a moeda de ouro e dai-a ao que tem dez. Eles responderam-lhe: Senhor, ele já
tem dez. Pois eu vos digo que a todo
aquele que tiver, se lhe dará, e terá em abundância; ao que não tem, será
tirado ainda mesmo o pouco que tem". Creio que nesta última palavra
encontramos a explicação. Pois, quem no juízo particular foi aprovado é porque
morreu sem pecado mortal. Isto significa que, se cometeu pecados mortais, por
palavras, obras e omissões que causaram escândalos e prejudicaram gravemente o
próximo, não só ou se arrependeram com
contrição perfeita e desejaram receber o sacramento da penitência, ou se
arrependeram com a simples atrição e receberam os sacramentos da penitência
e/ou extrema unção, mas também se propuseram ou procuraram reparar na medida
do possível todo escândalo e prejuízo (do contrário não teria havido
verdadeiro arrependimento). E diz a Sagrada Escritura: "Se o ímpio fizer
penitência de todos os pecados que cometeu,(...) Eu não me lembrarei mais de
nenhuma das iniquidades que praticou"(Ezequiel XVIII, 21 e 22). Ora, se Jesus não vai se lembrar delas no
Juízo Particular, também no Juízo
Universal e "a fortiori", nem das suas más consequências após túmulo
até o fim do mundo. Portanto, quem se salva, além de não ser penalizado pelo
mal que talvez praticou em vida (pois dele fez penitência), receberá um
acréscimo de prêmios pelos frutos de suas boas obras mesmo aqueles posteriores
à sua morte até o fim dos séculos. E assim: Todo aquele que tiver, se lhe dará, e terá em abundância.
Em relação aos condenados, os papéis se invertem: Se fizeram
boas obras, ou já nasceram mortas pelo fato de seu ator estar em pecado mortal,
ou perderam a vida (obras mortificadas) por pecado(s) mortais subsequentes e com
os quais o pecador morreu. Estas obras boas mas mortas ou mortificadas e que
não merecem prêmio sobrenatural, Deus, sendo a própria Justiça, as recompensa
com bens naturais materiais aqui na terra. Por isso diziam os santos que era
mau sinal para os pecadores públicos e inveterados serem cumulados de fortunas, prazeres e
gozarem sempre de saúde. Por outro lado,
os condenados receberão penas adicionais no Juízo Final pelos maus frutos de
suas obras más, subsequentes à sua morte até o fim do mundo. Ao que
não tem, será tirado ainda mesmo o pouco que tem.
É óbvio, caríssimos e amados leitores, que em se tratando de
mistérios de Deus, a inteligência humana, mesmo iluminada pela fé, poderá ir até
certo ponto mas nunca lhe será permitido pretender compreender inteiramente os
insondáveis desígnios divinos. Daí dizer S. Paulo: "Sapere ad sobrietatem" (Rom. XII, 3). Amém!
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