Instituição da Eucaristia e do sacerdócio
"No cenáculo, assim como há mais que uma refeição,
assim também há outra coisa além do sacrifício. Há a instituição de um novo
sacerdócio. Como teria Jesus dito aos homens: Se não comerdes a minha carne e não beberdes o meu sangue, não tereis
vida em vós, se não pensasse em criar um ministério, pelo qual renovasse,
até ao fim dos séculos, o que então acabava de fazer na presença dos doze
Apóstolos? Ora, eis aqui o que diz a estes homens que escolheu: Fareis isto em memória de mim. Dá-lhes
por estas palavras o poder de converter o pão em seu corpo e o vinho em seu
sangue; e este sublime poder transmitir-se-á na Igreja pela sagrada ordenação,
até à consumação dos séculos. Jesus continuará a realizar pelo ministério de
homens mortais e pecadores, o milagre que fez no cenáculo; e, ao mesmo tempo
que dota a sua Igreja com este único e perpétuo sacrifício, dá-nos , segundo
sua promessa, com o pão do Céu, o meio de nós permanecermos nele, e ele em nós" (D. Guéranger, Ann.
liturg.).
Estas duas instituições reunidas encerram dois poderosos
motivos de reconhecimento, que hão de ser hoje o objeto da nossa meditação. O
primeiro refere-se a todos os fiéis:
Accipite et manducate, hoc est corpus meum..., accipite et bibite, hic este
sanguis meus; [tomai e comei, isto é o meu corpo]; o segundo refere-se em
particular aos Sacerdotes: Hoc facite in
meam commemorationem [Fazei isto em
minha memória].
I. Amor de Jesus Cristo para com os homens na instituição dos
mistérios deste dia: Hoc est corpus meum
[Isto é o meu corpo].
II. Amor particular de Jesus Cristo para com os seus
ministros: Hoc facite in meam
commerationem.
I. Amor do Salvador
para com os homens na instituição dos mistérios deste dia. A Eucaristia é o
testamento do Filho de Deus, que vai morrer; é um dom, último penhor da sua
ternura. Qual é este dom? A quem é feito? Quando e porquê é ele feito? Só o
amor infinito era capaz destas invenções inefáveis, que já os profetas
entreviram: Notas facit in populis
adinventiones ejus [Isaías, III, 10).
1º "Tendo amado os seus que estavam neste mundo amou-os
até ao fim". Tudo estava preparado, e era chegada a hora de cumprir o
grande desígnio formado pelo Coração de Jesus. "Enquanto ceavam, tomou
Jesus o pão, benzeu-o, partiu-o, e deu-o a seus discípulos, dizendo:
"Tomai e comei:isto é o meu corpo, que será entregue por amor de
vós". E tomando o cálice, deu graças, e deu-lho, dizendo: "Bebei dele
todos, porque isto é o meu sangue do Novo Testamento, que por vós será
derramado" (Mat. XXVI, 26). Posso eu ouvir estas palavras, sem me sentir
tomado de respeito e transportado de amor?
Isto é o meu corpo, isto é o meu sangue! Que é o que Jesus
nos dá? É infinitamente mais que o seu reino; é Ele mesmo, seu poder, sua
bondade, suas graças, seus merecimentos! ... A sua carne crucificada por amor
de nós identifica-se com a nossa carne; o seu sangue, que salvou o mundo,
mistura-se com o nosso sangue. Nossa alma une-se à do Redentor; sua divindade
penetra-nos, e consome em nós tudo o que o pecado havia corrompido. O amigo
fiel repousa no nosso seio, e diz-nos:
Pone me ut signaculum super cor tuum (Cant. VIII, 6) (=Põe-me como selo
sobre o teu coração).
Ó homens, buscai algum bem, que não esteja neste dom
inestimável! e vede se o amor de Jesus para convosco o não tornou pródigo de si
mesmo, pois julgou que era muito pouco dar-vos tudo o que possui, se vos não
desse também tudo o que Ele é: divindade e humanidade!...
2º Mas, a que homens privilegiados será destinado tão mimoso
favor? Será reservado para a incomparável Virgem, para o apóstolo a quem Jesus
amava, para algumas almas escolhidas, êmulas da pureza de Maria e de São João?
Não. Jesus concede-o a todos os seus discípulos: Deditque discipulis suis, a todos os filhos da sua Igreja, de todos
os tempos, de todos os lugares, de todas as condições.
Ninguém é excluído, se não se exclui por sua própria
vontade; e é por isso que, depois de ter feito este prodígio, compêndio de
todos os prodígios, ordena aos seus ministros que façam o que Ele acaba de
fazer, que perpetuem este milagre de amor, renovando-o até ao fim dos séculos,
em toda a parte onde conquistarem para Ele servidores. Oh! como é verdade que o
seu amor para conosco não tem limites, pois se dá todo inteiro e a todos! E
este amor é também desinteressado.
3º Quando instituiu a Eucaristia, que esperava Ele dos
homens? Quando lhes dava uma prova de seu generoso e extremoso amor, que Lhe
preparavam eles? É na véspera da sua Paixão, in qua nocte tradebatur [na noite em que seria entregue], no
momento em que os Judeus deliberavam sobre os meios a empregar para Lhe darem
uma morte infame e cruel, no momento em que Judas Iscariotes buscava ocasião de
o entregar ao seu ódio e inveja. Quando os homens mereciam mais sua indignação,
é que Ele leva o amor para com eles até aos últimos limites: In finem dilexit eos. Vê o que se
maquina contra Ele, conhece as profanações futuras e os atentados presentes;
nada o detém: Aguae multae non potuerunt
extinguere caritatem, nec flumina obruent illam (=As muitas águas não puderam extinguir
o amor, nem os rios terão força para o submergir].
4º Finalmente, que se propõe Ele nesta admirável
instituição, senão vencer a excessiva perversidade com a excessiva bondade? Os
homens rejeitam-no, vão dentro em breve
gritar: Tolle, tolle, crucifige eum
[Tira-o, tira-o, crucifica-o]; e ele prende-se a eles para não os deixar mais.
Querem, por assim dizer, com seus enormes crimes, forçar Deus a feri-los sem
misericórdia, e Jesus quer interpor-se como vítima de propiciação, com um
sacrifício perpétuo, entre a justiça de seu Pai e os crimes dos homens. Não podem
suportá-lo; e Ele, dir-se-ia que não pode abandoná-los; só se achará bastante
perto deles, depois que tiverem comido a sua carne e bebido o seu sangue! Quer
ser o alimento de suas almas; Ego
reficiam vos; quer comunicar-lhes sua vida divina, que aproveitará
também a seus corpos, e em virtude da
qual os ressuscitará no último dia (cf. S. João, VI, 55).
Tais são os intuitos do seu amor neste mistério: estar
sempre com os homens; sacrificar-Se sempre por eles; unir-Se a eles como seu
alimento, para os transformar nele. Até ao fim dos séculos, terão junto a si o
tabernáculo em que reside, o altar em que se imola, a sagrada mesa em que se dá
como alimento.
II. Amor do Salvador
para com seus ministros na instituição dos mistérios desde dia. [Só darei o
resumo].
A Eucaristia, que é a riqueza de toda a Igreja, é o tesouro
particular do sacerdócio. Houve jamais ministério tão divino? Como o exerceis
vós, ministros do Senhor? Honrai hoje o Santíssimo Sacramento e o sacerdócio
com especial devoção. (Extraído do Livro "MEDITAÇÕES
SACERDOTAIS" de autoria do Padre
Chaignon, S. J.).
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